domingo, 15 de agosto de 2010

Quase

Depois de um tempo em busca de um título para o romance, acredito que encontrei um que muito me agrada, por definir bem o enredo, a partir de palavras que considero essência do texto, como rio, quintal, jardim, gavetas, água, muita água em suas metáforas.
O que é e o que não é “real” num mundo construído pelo pensamento, pelo desejo, pela existência das coisas que “não são”? As verdades de cada coisa, a força da imaginação, a visibilidade das coisas, tudo construído pela palavra e pelo olhar. O olhar de cada um, e o alcance das imagens de cada um. É lá que está o horizonte.
Real, denso, bastante denso, mas há ali algo de esperança: gavetas e mais gavetas de onde cada personagem guarda ou retira os seus rios, as suas águas, os seus quintais, os seus jardins, os seus pedaços, e as suas vivências silenciosamente compartilhadas. Por mais escassos que sejam os diálogos, há ali a voz de algumas palavras, mesmo que calada. É quando surgem os murmúrios, a voz que deixa de ser quase calada, o grito, o olhar, e novamente um silêncio nem sempre denso, nem sempre distante, nem sempre ausente, mas ali, afetos compartilhados, sutilmente depois o círculo, ininterrupto.
Já revi os dois primeiros capítulos, e agora já avanço no terceiro. Ao ler o primeiro, que estava com 23 páginas, senti vontade de abandoná-lo. Começaria tudo a partir do segundo capítulo. A sensação de que eu já estava cansado demais para rever, reler, enxugar, refazer… Mas não, eu sabia que ali estava o começo, a matéria, eu tinha a matéria, faltava a paciente restauração das ideias iniciais que chegam às vezes com muita volúpia. Pronto. Agora são 20 páginas, e sei que além dos cortes feitos nos demais capítulos, outros ainda acontecerão, outras palavras serão substituídas e frases que serão reestruturadas. Mas é exatamente assim, uma busca que parece incessante.

4 comentários:

  1. querido amigo,

    Esse título tá lindo, não li o livro,mas o título sugere tanta coisa, certamente é o que está além, ou que não chegou a ser jardim que vai ficar. Aquilo que talvez não vejamos simplesmente com o olhar rápido, é o que tá digamos na versura, como diz o teórico.
    Eu adoro jardins, títulos de jardins, lembro do Borges, "jardins de caminhos bifurcados" que faz tanto sentido na minha história, assim como jardins labirínticos,ou "quase jardim".
    parabéns, lindo, mto poético, como é a sua escrita.
    beijo grande, elis

    ResponderExcluir
  2. Elis! Muito prazer ler o seu comentário, saber a sua opinião, sentir as suas palavras. Você e o seu olhar amplo, perceptivo."Quase jardins" é mesmo um universo cheio de caminhos que quase se perdem, quase se encontram, quase são, e depois alguns e outros não.

    ResponderExcluir
  3. Sempre que chego a este sítio há algo que me convida a retonar. Aguardo o livro Quase Jardins.

    ResponderExcluir
  4. Caro I.

    Li o seu artigo no blog ALA e percebi um elo com o seu artigo aqui em destaque. Nos dois há uma coisa comum aos escritores. Penso que que seja a evidenciada angústia. Ela que é apenas um indicativo e nao se autorepresenta.
    Lacan afirma que, quando o desejo está prestes a aser realizado, a angústia aparece para cortar o prazer do seu gozo que é insuportável.
    Penso dessa maneira quando faço leituras sobre a escrita.
    E parabéns pela sua, pois é de muita fluidez.

    ResponderExcluir