segunda-feira, 30 de maio de 2011

O cheiro íntimo de si mesmo


Não viu mais nada, invadido pela cegueira que não chegou abruptamente, mas pouco a pouco, dissimulada a cegueira silenciosa como nuvens esparsas, sutis, de vez em quando as imagens realçadas por uma sutileza quase invisível, até que depois. Mas antes, eram quadros pincelados em coloridos, ainda que as melancólicas horas, as cores expostas nos quadros enfeitando as paredes, não apenas as de fora, mas as paredes palpitantes no interior de si mesmo: balançando os sonhos enfeitados e as dores, elas tão expostas ao perceber que, lado a lado, dos sonhos, havia uma crosta arranhando o que em si era muito mais fragmentos e pedaços outros impotentes. A vida lá fora, fingida a vida lá fora, bailando num som estridente vindo de algum lugar às vezes tão desconhecido, às vezes, e outras já tão íntimas demais. E, portanto, ao abrir a porta… Ao abrir a porta, no meio da noite, nenhum colorido: sentimentos confundindo-se entre o que até podia ser chamado de felicidade, e a certeza outra, muito mais forte a certeza outra, corrosiva,

e no travesseiro o cheiro íntimo de si mesmo.

3 comentários:

  1. "o cheiro intimo de si mesmo", as palavras soltas pelo vento e outras, outras tantas colorindo o papel, tingindo de sentido o vazio íntimo da vida...
    Adorei o texto!
    Bjs

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  2. Mais uma vez, o avesso do avesso do avesso...Beijos, Ismar querido!
    Elvira.

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  3. Uma vertentes com dois segmentos. A aparência e a essência, ou o que é realmente positivo e o que é o vazio. Um texto refinado onde cada um pode perceber em que espaço se encontra na verdade. O que mais mexeu comigo foi o final, quando o pensamento não nos deixa enganar. "E, ao abrir a porta… Ao abrir a porta, no meio da noite, colorido nenhum: sentimentos confundindo-se entre o que até podia ser chamado de felicidade e a certeza outra, muito mais forte a certeza outra, corrosiva,

    e no travesseiro o cheiro íntimo se si mesmo. "

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