domingo, 6 de janeiro de 2013

A ponte, apesar do rio - II


A ponte permanecia esbelta e imponente enquanto o diálogo tentava encontrar um termo adequado, uma resposta adequada, uma palavra adequada, qualquer coisa adequada que definisse a agradabilidade daquele momento singular. Afinal, nada se repete. O que pensamos ser uma repetição é, na verdade, uma nova versão do instante que foi um anterior.

No tempo, nada se faz igual, se sempre há algo que diferencia um instante de outro, mesmo que sutil ou imperceptível. As sensações apresentam qualquer que seja aquilo que vem a ser um diferencial no que seria uma repetição fiel: o cheiro, o sentimento, o impacto, o entusiasmo, o toque, o sabor, o prazer, nenhuma sensação se faz exatamente a mesma, assim como nenhuma imagem é recomposta com exímia fidelidade ao que chamamos imagem real. Talvez o espelho. Mas o “talvez” é indefinível, inconfiável. O espelho em seu reflexo do outro, intocável e inexistente em sua imagem refletida e sem pensamento algum.

Tudo é uma ponte. Uma ponte que nos leva ao que é e que se apresenta em novas faces, para mais ou para menos. Às vezes, tão semelhantes que se confundem. Há sim uma ponte sobre o rio, e sobre a água a sua imagem refletida, bailando intensa, branda, invisível, a depender da luz de cada instante.

- Não preciso repetir que foi a ponte que me trouxe até aqui novamente. Não apenas a ponte sobre o rio, interligando as cidades, mas a ponte entre os rios que somos nós. Nós somos rios e precisamos de pontes para percorrermos de um lado para outro de nós mesmos.

A ponte é para que travessias sejam possíveis, e aqui estou. Não mais a travessia de ontem, embora o percurso e o propósito sejam os mesmos. O ontem originou o agora e se desfez para ressurgir com os seus múltiplos sentidos durante a travessia que pretende tornar melhor o que ontem já havia sido. Veja a ponte. Veja o rio! [Pausa]. Até quando a ponte e o rio? Será que ainda amanhã? [Pausa]. Não precisa responder nada. Pode ser que tudo seja apenas uma longa elucubração. Já é tarde, deixemos algo para amanhã.

(Amanhã é um dia que não existe. “Não presumas do dia de amanhã...”).

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