terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Espelho


Espelhos

Com a bagagem em suas mãos, ele fechou a porta da casa e foi em direção ao carro, decidido a não olhar para trás. Não queria desistir de ir embora e nunca mais retornar.

Ao abrir o bagageiro, deparou-se com a antiga mala herdada da mãe: a bagagem preparada na semana anterior, quando ele partiria sem olhar para trás para não se ver abandonando a casa vazia. Entretanto, olhou pelo retrovisor e viu aquela imagem que lá ficaria. Não resistiu.

Na semana seguinte, ele desistiu de bagagem. E na estrada lamentou o jardim de cores que se perdem com o tempo.

Mirrors*

With the luggage in hand, he closed the door and went toward the car determined to not look back. He did not want to give up on leaving and never returning.

As he opened the trunk, he found himself looking at the suitcase he inherited from his mother - the luggage prepared the previous week, when he would leave without looking back so that he would not have to see himself abandoning the empty house; however, he looked through the rear view mirror and captured his memories. He could not resist.

The following week, he gave up the luggage. On the road, he cried the lost colors’ garden forever.

Mirrors*

With the luggage in hand, he went toward the car determined to not look back. He did not want to give up on leaving forever.

As he opened the trunk, he found himself looking at the suitcase he inherited from his mother - the luggage prepared the previous week, when he would leave without looking back to not see himself abandoning the house; however, he looked through the rear view mirror and captured his memories. He could not resist.

The following week, he gave up the luggage. On the road, he cried the lost colors’ garden.

*Possíveis traduções (?)

terça-feira, 11 de novembro de 2014

Nem você, Madalena?


Tocou a sirene uma vez. Duas. Três. Quatro vezes tocou a sirene e desta vez prolongou por quase dez segundos aquele som lá dentro da casa, e assim trouxe para aquele instante o menino de outrora: brincou de bola, fez gol, comemorou o toque de gude na outra gude que estava tão distante, ele feliz. Era fim de tarde de sábado, e ele corria em brincadeiras pela rua enquanto a sua ausência era pouco percebida em sua casa, em meio às visitas de amigos dos pais e dos irmãos mais velhos.
A sirene ecoava insistentemente, sem ele ter a menor ideia de que a casa estava vazia, sem nada na cozinha, sem nada nos quartos, sem nada a não ser uma frágil camada de poeira a cobrir o chão, as pias e a mesa da sala. Tudo o que havia restado daquele tempo era a mesa da sala, o móvel mais pesado e resistente da casa, deixado para trás, ainda no mesmo lugar de quando ele havia partido. Nada ao redor da mesa. As cadeiras haviam sido levadas, uma a uma, nem se sabe exatamente por quem; os objetos repartidos entre alguns amigos e dois ou três vizinhos mais próximos. No mais, alguns objetos vendidos, e tudo deixando de ter sentido algum.
“Para de tocar essa sirene, menino!” Enquanto ninguém aparecia para abrir a porta, ele foi tomado por recordações do menino que ele havia sido. Ele se divertia e soltava gargalhadas quando Madalena, que havia chegado de longe, em busca de emprego na cidade, gritava de lá de dentro, e resmungava, sem raiva alguma: “Diacho de menino perturbado.” Era assim que ela abria a porta para ele, enquanto repetia: “diacho, diacho de menino atentado.” Ele, minutos depois, silenciosamente, bem na ponta dos pés, atravessava a casa, abria a porta da rua, puxava-a bem cuidadosamente para não fazer barulho, e novamente tocava a sirene. Tocava-a já se contorcendo para não deixar explodir a gargalhada. Ele se divertindo só em imaginar o resmungar de Madalena, que deixava os seus afazeres na cozinha e ia abrir a porta. Madalena! Ela que, no fundo, bem raso o fundo, e quase sempre com uma expressão fechada, também se divertia com as peraltices daquele menino.
Minutos mais tarde, tudo outra vez. Ele entrava no quarto ou no banheiro e fechava a porta, de modo a Madalena entender que ele estava lá dentro. Às vezes, ele nem entrava, e outras vezes ele abria a porta, bem devagar, e saia de mansinho. Tudo novamente, mas de outra maneira. Abria a porta da sala, pulava a janela, saia pela porta do fundo, fazia qualquer coisa para driblar Madalena. Tudo para novamente tocar a sirene e imaginá-la resmungando: “deve ser o diacho daquele menino”, “não é possível que é o diacho daquele menino de novo, atazanando o meu juízo”. E ele caia na gargalhada, feliz, só em imaginar o resmungar de Madalena: “diacho de menino”.
Ainda mais feliz ele ficava quando ouvia aquele som ecoando pela casa, “ô diacho, é você que já está ai fora apertando o diacho dessa sirene outra vez?”, justo em dias que não era ele lá fora. E ela abria a porta, convicta de que era ele, resmungando embravecida: “ô diacho, é você...” Madalena ficava ruborizada de vergonha. Não era. E ele se divertia tanto! Observando-a, lodo ali atrás dela, e feliz em tanta gargalhada.
Ele e Madalena eram assim. Nos dias em que ele ficava quieto, calado pelos cantos, ela se aproximava dele, séria, com o seu jeito de afeto bem escondido, e queria lhe dar o mundo. Quando o “diacho” do menino ficava quieto demais pelos cantos, Madalena queria lhe dar o mundo. Ela perdia ainda mais a graça de tudo, quando ele ficava daquele jeito, pelos cantos. Ele, esperto que era, em alguns dias fingia, só para que ela lhe oferecesse o mundo outra vez.
Ninguém. Em toda a sua vida, ninguém havia dado tanta atenção a ela quanto o “diacho” do menino. Sem os seus toques na companhia, pouca graça havia na vida de Madalena. Ele a tocar uma, duas, três, quatro vezes, depois das suas artimanhas para sair bem de mansinho sem que ela percebesse. À noite, quando em seu quarto, Madalena sorria sozinha, feliz, uma alegria pelas peraltices do menino, ele soltando imensas gargalhadas ao seu lado, dando a ela a atenção que ninguém nunca havia lhe dado. Nas tardes de sábado, quando retornava a casa e ainda havia visitas de amigos dos pais e dos irmãos mais velhos, ele entrava direto à procura de Madalena, e ela já tão preocupada com sua demora. Ninguém percebia que ele esteve ausente, apenas ela, Madalena, ali, já com o mundo inteiro para lhe oferecer, caso ele retornasse cabisbaixo, pelos cantos. Ela se lembrava de tudo isso, sozinha, à noite, soltando sorrisos em seu quarto.
Ele, agora lá na porta, em muito se lembrou de Madalena. Uma, duas, três, quatro vezes, e sentiu uma saudade imensa.
- Ninguém! Nem você, Madalena? Preciso tanto que tente me dar o mundo inteiro outra vez!

quinta-feira, 16 de outubro de 2014

que não havia sido nada a não ser o número do telefone

Perdeu o número do telefone no meio dos papéis, anotações, rabiscos de narrativas
ou mesmo um poema depois de tudo
perdeu o número do telefone
e os olhos azuis brilhando
em sua memória o olhar bem azul
e os seus olhos em busca do número do telefone
misturado a tantos papéis sobre o armário, empilhados os papéis
desordenadamente
em meio ao desejo,
o desejo de algum telefonema assim que retornasse
daquela viagem.

Nem acreditou direito!
Nem acreditou e nem assimilou direito quando, quase no mesmo lugar, os olhos azuis reluzindo
repentinamente,
surgindo de lá,
na contramão do passeio público.

Quem, quem na contramão do passeio público? E os olhares apreensivos, mais inexplicáveis que da primeira vez, e o azul brilhando muito mais que antes, o brilho azul penetrando dentro
dos olhos negros
e o silêncio,
e o desejo de explicação, e o desejo,
o desejo de explicar que não havia sido nada a não ser o número do telefone, perdido
no meio de tantas anotações que nem eram poema,
não eram,
ainda.

quinta-feira, 2 de outubro de 2014

Num entra e sai num entra e sai num entra e sai


Ela já estava perto da porta quando disse, bem alto, que iria ali buscar qualquer coisa que eu não entendi direito o que era, tamanha a sua pressa e depois o eco da batida da porta a me confundir ainda mais. Para não dizer que eu não ouvi nada, eu só ouvi quando ela disse Mããããeee como se eu estivesse lá não sei onde, e eu bem aqui perto, feito uma louca pra fazer o melhor que posso por aquela menina.

Rosalinda sempre foi assim, num diacho de uma correria desenfreada, num entra e sai do quarto e num entra e sai do banheiro e num entra e sai por aquela porta da rua. Num entra e sai num entra e sai num entra e sai sem fim, uma coisa que nem eu e nem o pai e nem o irmão e nenhum dos avós nunca foi de ficar fazendo.

Minutos depois, coisa de uma horinha de relógio, advinha quem entra! Ela, a Rosalinda, e de novo Mãããeee, cheguei! E foi tudo o que ela disse. Quando eu vim de lá de dentro da cozinha para saber que desespero era aquele, o que eu ouvi foi só a batida da porta do quarto e o danado do eco novamente a perturbar o meu juízo que já vive meio assim de tanto entra e sai dessa menina, e de tanto bate-porta, e de tanto gritar Mãããeee e dizer lá não sei o quê.

Fui em direção ao quarto, já quase gritando:

Ôh, Menina, o que é que está acontecendo que hoje você está nesse entra e sai pior do que nos outros dias?

Mas, na mesma hora, eu fui tomada por uma voz que me socorreu e disse:

“Arelzina, Arelzina, larga essa menina pra lá, pois você sabe muito bem o que foi que ela lhe disse da última que você bateu na porta desse quarto!”

Pois bem, eu larguei pra lá. Mas fiquei com essa pergunta engasgada no meio de minha garganta, bem aqui, ó, e com o coração na boca, quase escapulindo pra fora.

Menina, o que é que está acontecendo que hoje você está nesse entra e sai pior do que dos outros dias? Você está pensando o quê, menina? Que você vai me enlouquecer feito a Almelinda? Ah, mas não vai mesmo, Rosalinda! Não sei onde foi que eu estava quando eu inventei de colocar esse nome em você! Rosa linda! De rosa você não tem é nada.

Eu ia dizer bem assim pra ela, mas a danada daquela voz que fica num entra e sai num entra e sai num entra e sai de minha cabeça falou aquelas coisas lá e o resultado foi que eu fiquei com essa coisa espinhenta bem no meio de minha garganta. Bem aqui, ó!

Rosalinda! Ah, Rosalinda! Essa menina, sei não, viu! De rosa não tem é nada. E agora acaba de vir uma coisa em minha cabeça... Ainda bem que eu não disse que de rosa ela não tem é nada. Deixa pra lá, melhor eu ficar com essa coisa espinhenta em minha garganta.

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Quase pluma, e jorrando


Ontem ela saboreou uma garrafa de vinho quando a sua pretensão era apenas uma taça, a pretensão de ser apenas uma quando desconfiava que a taça seguinte estava a um gole de proximidade de seu desejo. Dois goles, todos os goles da taça saboreados enquanto a vida se fazia pluma.

A vida era quase pluma quando, levemente ruborizada, ela desejou que a pluma flutuasse ao leve vento da noite. E então viu jorrar sobre a taça o vinho que lhe dava gozo inexplicável no corpo e dentro de algum lugar que ela não conseguia expressar qual era. Gole após gole a pluma voava e ela também flutuava com as asas que cresciam sem pressa alguma.

O voo leve. Ela queria um voo leve enquanto contemplava a pluma leve voando ao seu redor, ela reservando o impulso para a taça seguinte. Quase uma hora depois, a taça seguinte. E a vida que era pluma bailava diante do seu olhar, até que o instante presente era um novo gole escorregando dentro dela, e o gozo.

A vida era quase pluma quando ela segurou a terceira taça de cristal servida, novamente o prazer jorrando dentro dela.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Cais desordenado



Amanhã partirei novamente, com a certeza de que é sempre hora de partir e é sempre hora de chegar. Mais uma viagem de volta, a volta que pode ser para partir ou para chegar. Eu parto de um cais desordenado em suas águas ora inquietas e ora tão suavizadas, eu parto mergulhado em imensas imagens absorvidas em mim.

Dentro de mim o calmo cheiro que não se apaga com qualquer vento, ainda que vendaval; comigo, as lembranças de horas inesquecíveis e mais um contentamento do outro lado do rio! Longo, tão longo o rio, e o cais. Não, não, ó tempo! Não arrancarás de mim o doce sabor dos instantes guardados em fotografias eternizadas não apenas em meu peito, e bem sei que tu, ó tempo, não permitirás que fotografias outras partam de mim, escorregadias em seus limos tão viscosos com o tempo.

Amanhã partirei novamente e ouço a Abertura de Tannhäuser, tão intensa quanto eu neste momento. Nela, eu mergulho como se fosse o rio! A cidade encantadora e cheia de imagens guardadas em mim à margem do rio, o rio, o rio e outras imagens repousadas sobre a cama, o final do vinho ainda marcante no paladar, e o cheiro do perfume novamente a preencher recordações, algumas intraduzíveis.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

A memória embalando a canção


Ela entrou no quarto e fechou a porta
brincou de boneca
fez laço de fita
enfeitou o cabelo,
dela,
em frente ao espelho.

A boneca de cabelos longos, desalinhados
agora também enfeitada com um laço de fita.
Depois,
ela segurou a boneca com as duas mãos
repousada, a boneca, no conforto de seu peito.

Ela cantarolou uma canção, bem baixinho
cantarolou, cantarolou...
depois chorou, lá dentro dela, no meio da canção.

Ela,
a menina, tantos anos atrás.
E agora,
a memória embalando a canção.

quarta-feira, 4 de junho de 2014

Uma ideia para um texto

Hoje, enquanto eu tomava café da manhã, olhava o dia lá fora e veio a mim a ideia de escrever um conto que comece assim: “Eram duas mulheres. Uma se chamava Maria e a outra também Maria. Uma era das Graças e a outra das Dores”.

De repente, a minha memória deu um zoom no tempo e evidenciou dados ainda desordenados, deixando comigo a suposição de que esta ideia não tem nada de novo. Uma sensação de que alguém bem conhecido já escreveu um conto, qualquer gênero, um texto exatamente assim. Duas Marias iguais, e diferentes. Uma era assim e a outra de outro jeito; uma pensava assim e a outra de maneira oposta.

Na perspectiva de não estar repetindo o já dito (e a depender do ponto de vista devo dizer “ilusória perspectiva”), comecei a pensar noutra coisa. Uma coisa comum, bem comum, quase o óbvio, mas fiquei ali pensando: tudo parece já ter sido dito ou repetido neste tempo pós-moderno, ou contemporâneo. Pós-Moderno é tão pós que ainda deixa polêmicas no universo conceitual: o tempo pós-moderno, a pós-modernidade cultural, o modernismo tardio, o pós-modernismo estético e outros pós.

Retornando: tudo se repete e é espalhado nesta contemporaneidade onde tudo (entre aspas, talvez) se intercala e se faz novo (a propósito, uma transcrição: as coisas velhas já passaram, eis que tudo se fez novo), sem que, contudo, cada texto se desloque ou seja deslocado de seu caráter, único, transponível tantas vezes em referências tão sutis, ou nada de referência mas apenas semelhanças casuais em tempo e espaço paralelos ou adversos.

Não sei o enredo da narrativa composta por Maria das dores e Maria das graças, as duas num mesmo texto, e nem sei se realmente vi alguma referência, e se vi, ou quem escreveu. A poesia. Foi na poesia. Foi? Mas se de fato elas assim existem dentro de um contexto literário, não sei se a das graças era a que sofria as dores e se a das dores era a que recebia mais misericórdias ou se era das Dores mesmo.

Na verdade, ao pensar nas duas Marias, eu pensei mesmo foi neste antagonismo que até rima com pós-modernismo. Uma rimazinha fraquinha, ismo com ismo, mas, por outro lado, haja Maria para discutir estes dois termos! E, ao dizer Maria, digo também João. Mas, retomando o começo da ideia, do conto, do texto:

“Hoje, enquanto tomava café da manhã, olhava o dia lá fora, e veio a mim a ideia de escrever um texto que comece assim:”. Interrompi o pensamento. A companhia tocou, ele foi até a porta e, tão indeciso quanto ao seu humor naquela manhã, ficou sem saber se abriria ou não. A companhia sem aviso prévio, o café esfriando, e ele, sem decidir se queria, abriu a porta. Era ela. Ela, propositalmente, chegou sem aviso prévio e com um sorriso largo, e ele obrigou-se a fazer o mesmo um sorriso largo. Imediatamente após aquele imprevisto, ele exclamou:

- Maria! Maria das Graças!

Ela soltou uma gargalhada, e logo em seguida afirmou não haver mais graça alguma em ele trocar o seu nome, e que ela não tinha problema nenhum em ser das dores, se era cheia de graça. E foi enfática:

- Das Dores. Maria das Dores.

Tomei mais um gole de café, e mais um, enquanto pensava na sequência da história, e pensei na possibilidade de a dor ser metamorfoseada, ela mesma se metamorfosear e alçar outros voos; deslocar-se ao encontro de algum prazer, algum gozo. Afinal, o indesejado pode ser um meio para aquilo que virá a ser alívio, o não ser para ser, e o ser para não ser. Dores e graças: nomes, apenas nomes, e o efeito de cada palavras enquanto sentidos bem ao pé da letra. Talvez, eu divagando, talvez. Talvez é um sentido que não define tanto, é instável, é indefinido, e, às vezes, o seu estado tênue é uma sensação que provoca dor. Outras vezes, causa graça.

Tomei mais um gole de café. Catei palavras, percorri a criação em busca de uma sequência, e nada. Por um tempo, nada, mas há um tempo, a criação pode ser interrompida, temporariamente, uma necessidade até, tantas vezes.

Ele ficou parado diante dela. Ela, como às vezes fazia, não entrou em sua casa naquele dia. Da mesma maneira agia Maria das Graças. Tudo era relativo. Elas estavam ali, o acaso e a intuição, elas se revelando independentes, firmes. Imprevisíveis, transcendiam ao sabor do instante, e se multiplicavam num percurso desenhado não apenas pelo imaginário.

domingo, 25 de maio de 2014

Imponentes como cavalos cavalgando


Ela passou quase o dia inteiro dentro do quarto, pintando e desfazendo quadros em seu próprio interior. Mas no início da noite, depois das horas precisas nos quadros e monólogos desfeitos, espreguiçou-se no chão, na penumbra do quarto com as portas e janelas fechadas, e inclinou a cabeça em direção à fresta da porta. Ao ter aquele opaco jato de luz refletido em seus olhos, pensou no quanto a vida podia estar diferente lá fora.

Sentiu tanta vontade de se levantar! Mas o desânimo que sutilmente havia se acumulado em seu ser era um peso quase invencível em seu corpo. Persistia em mover os braços, as pernas, as costas, os pés, mas era vencida em cada batalha. E as horas passavam alheias, imponentes como elegantes cavalos cavalgando numa estrada que parece sem fim.

Demais fragilizada, ela previu e repetia para si mesma que a sua reação tinha que ser num ímpeto. E foi assim. Surpreendendo a si mesma, ela moveu as pernas, moveu as mãos, desprendeu as suas costas do chão, sentou-se e encarou a luz agora mais opaca. Encarou a luz da fresta que se apagava e, novamente num ímpeto, levantou-se. Logo em seguida arrancou a roupa de dormir, usada desde a noite anterior, abriu as cortinas do quarto, viu que era mais de seis horas da tarde, e por um instante, sentiu muita vontade de sair dali.

Ao se encaminhar em direção a porta do quarto, viu a sua nudez estampada no imenso espelho da parede, e no corpo as marcas das dobras do lençol. E viu mais. Viu além. E aquela imagem em muito a incomodou. Ela não mais sabia exatamente quem era aquela.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Foi nada não!



Foi nada não
Foi apenas uma bola de sabão que voou, voou, voou
E depois se transformou
Encantada
No meio do salão.

Foi nada não
Foi apenas uma emoção que rondou, rondou, rondou
E depois evaporou
Desapegada
No meio da canção.

Foi não! Foi nada não
Foi apenas o coração que acelerou, acelerou, acelerou
E depois se acalmou
Protegido
No meio da contramão.

Foi não! Foi não!
Foi nada não!
Foi apenas um instante
Belamente fotografado
No meio da estação.


quarta-feira, 23 de abril de 2014

E algumas vezes era de pano


Quem olhava para ela nem desconfiava de que detrás de seus sorrisos largos havia outra, ela disfarçada de boneca de plástico, moldada para sorrir quando dispositivos são acionados por meio de baterias alcalinas. Tudo tão artificial, ela sabia, e inquietava-se: ela ruborizada, receosa de que desconfiassem que algumas vezes ela era boneca feita de pano e que o expressivo vermelho em seus lábios era linha de tecelã.

Ela sentia um temor imenso de que, inesperadamente, a bateria falhasse no meio de um sorriso escancarado em qualquer instante de contentamento. Tanto temor! E ela sentia um pavor imenso ao sentir que a linha de carretel acabasse. Logo o vermelho de seu sorriso abandonado no meio da felicidade!

Ela, a boneca de plástico e outras vezes de pano sentia alegria o dia inteiro! E tristeza apenas quando desconfiava de que o seu sorriso ininterrupto pudesse deixar de ornamentar as vitrines mais simples e as mais sofisticadas da cidade.

sexta-feira, 11 de abril de 2014

A loucura rodopiava



Ele desconfiava de que a mãe era louca. E às vezes parecia completamente louca. Era-lhe difícil admitir tal estado psíquico, logo da mãe! Ele lutava contra os próprios pensamentos e dizia que não, não, não, a mãe não era louca, a minha mãe não é louca, ele repetia, rodopiando pela casa e atormentado em seu quarto. Ele rodopiava em cima da cama, na hora de dormir, rodopiava, rodopiava como um parafuso que despenca no chão, sem rumo, e rodopia, rodopia e às vezes desaparece.

Ele, apesar de muito relutar, num esforço de convencer a si mesmo de que a mãe não era louca começou a admitir que não tinha mais como enganar a si mesmo e nem adiar o tempo. Assim, impotente diante do acúmulo de cenas atormentadoras, ele, num choro profundo, manifestou a dura realidade. Entretanto, apenas para si mesmo, tudo travado em seus pensamentos.

E depois, minutos depois, destravou.

A opressão forçou tanto que ele ouviu o ruir das paredes do pensamento, e, então, ele gritou desesperadamente em seu quarto, ele escondido debaixo do cobertor. “Ela é louca. A minha mãe é louca. A minha mãe, ela é louca”. E ficou ali, angustiado, ouvindo o eco de sua própria voz rodopiando dentro do quarto e atravessando as estreitas frestas da porta e da janela. O eco que atravessava a fresta da porta se misturava a outros que circulavam na sala e demais dependências da casa,ele desesperado, enquanto o eco que atravessava a fresta da janela circulava na rua e nos apartamentos circunvizinhos. Ele ainda mais encolhido debaixo do cobertor, e o vapor quente ruborizava o seu rosto sempre tão pálido.

sábado, 15 de março de 2014

O tempo e o cristal



O tempo é um vaso de cristal
disse o filósofo ao outro,
Um vaso de cristal, repetiu
ao que o outro respondeu:
O cristal não resiste ao tempo
mas o tempo ao cristal.
portanto, o tempo pode ser vaso
mas não de cristal.

O tempo é um vaso de cristal,
persistiu o primeiro filósofo:
É tão sensível que passa, evapora, a todo instante.

Um terceiro filósofo resolveu então se manifestar:
O cristal não passa, ele dura.
Até os seus fragmentos resistem ao tempo
mas o tempo não, ele não permanece.
Ele se vai a todo instante, se torna passado.
Até mesmo o presente e o futuro passam
e o tempo já não é, pois logo se faz outro.

Entreolharam-se, os três filósofos,
enquanto o tempo passava
e o cristal resistia a ele,
ainda que em fragmentos.

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

As palavras se vão


E depois as palavras desapareceram novamente. Elas desapareceram, depois de algumas ou tantas ao mesmo tempo, juntas. Harmoniosas ou não, juntas: elas saltitantes, arrumadas em fileiras, espalhadas na folha do caderno, ordenadas no livro aberto sobre a mesa e dentro de outros fechados na estante; as palavras na tela do computador e no outdoor da grande avenida; elas delirantes, sóbrias, compulsivas, e elas no silêncio: as palavras rodopiando na memória.

Elas sumiram. As palavras. Depois de (re)encontradas dentro do jarro de cristal, dentro da gaveta, no vaso de lixo, debaixo do chuveiro, em cima da estante, em cima do amontoado de livros, no meio da bagunça, no meio da prosa, colado no álbum de fotografia. Que ninguém se iluda. As palavras desaparecem. Elas somem em algum lugar que podemos chamar de névoa, labirinto, tantos nomes, tantos lugares, elas se fragmentam e depois somem.

As palavras se vão. Elas partem, vão e partem, e novamente a inquietude de buscá-las. Elas desaparecidas nas gavetas da memória e nas outras, no meio ou num canto da página, em vasos, nem todos de cristal. Elas em qualquer que seja o lugar e o prazer do encontro. Reencontro. As palavras desaparecidas estão detrás de qualquer espaço que pode ser chamado de névoa, labirinto, intuição, qualquer nome que seja lugar.

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A palavra estava



Encontrei a palavra
Dentro da mala
Dentro da caixa
Dentro do jarro
Dentro da gaveta
Dentro do vaso de lixo
Dentro.

Encontrei a palavra
Debaixo do chuveiro
Debaixo da cama
Debaixo do cobertor
Debaixo do tapete
Debaixo do vaso de cristal
Debaixo.

Encontrei a palavra
Em cima da estante
Em cima da toalha da mesa
Em cima do amontado de livros
Em cima da cama
Em cima da pia do banheiro
Em cima.

Encontrei a palavra
No meio da bagunça
No meio da rua
No meio da ponte
No meio da prosa
No meio do gole
No meio.

Encontrei a palavra
Dentro do olhar
Do lado de fora
Ao lado da cama
Colada no álbum de fotografias.

[-Tantas coisas a mesma palavra!]

sábado, 18 de janeiro de 2014

Reinventando olhares


Ao acordar, deparou-se com a parede do quarto completamente umedecida. Apesar de sua perplexidade inicial, foi invadido por uma brandura, pouco a pouco uma brandura e um espírito contemplativo diante da parede branca. A tinta resistente em sua espessura tão estreita, pele, película, camada endurecida pelo tempo, agora deslocada da estrutura do alto a baixo da parede. Ele permaneceu ali, de olhos fitos e olhar contemplativo, revirando páginas, reinventando olhares. Pouco a pouco, aquela camada se desprendia da parede como se gotas de água se acumulassem ali detrás, criando pequenos poços, alguns maiores, outros menores, a camada inteira prestes a se desprender da parede, deixá-la nua, sem cor, sem brilho. Ele contemplava aquele instante, mergulhava naqueles poços de água, enfrentava a correnteza, ele seguro de que ali detrás havia uma fortaleza, a parede intacta, revestida, ele nu debaixo da colcha branca, a sublime ausência de cor nas paredes, no tecido, na nudez. O algodão agora revestia o tecido branco sobre a cama, os seus fios resistentes, até quando, até onde. Ele, ali, horas depois, antecipava em seu olhar uma nova camada de tinta sobre a parede. Espessura resistente, a pele, a tinta, outra, outra vez revestindo a parede, até quando, até onde, até.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Um Cheiro de Tempo Encardido


Todos os sábados, ao final da tarde, na janela da casa soturna e recuada surgia um certo homem de olhar tênue entre sereno e melancólico. Um homem estático! Quase uma fotografia a observar o pequeno mundo lá fora, e que nunca havia crescido nem mesmo em seu olhar. Todos os sábados ele passava um tempo a ver as casas de frente a sua, paisagem nunca retocada em suas cores ofuscadas pelo tempo e descolorindo ainda mais o seu mundo. Durante aqueles dois a três minutos na janela, ele olhava os raros transeuntes que transitavam na rua enquanto ele era quase fotografia: de vez em quando algumas crianças gritavam ensurdecendo o seu silêncio e o de sua pequena cidade, e ele, num momento de surdez causada pelo seu distanciamento do presente instante, não ouvia nada além dos movimentos das bocas ecoando gritos abafados.

Numa junção de instante e numa emissão de voz que apenas ele ouvia, apossava-se de uma serenidade e respondia boa tarde aos que o cumprimentavam, ele sem nenhum desejo de cumprimentos, aliás, não era exatamente falta de desejo. Depois, fechava a janela até que chegasse o sábado seguinte, quando às 7h00 da manhã ele era um dos primeiros a chegar à feira, onde rapidamente fazia as suas compras e logo retornava para casa, auxiliado por um carregador ambulante que deixava tudo à sua porta. As compras seguintes eram apenas o pão na padaria perto de sua casa, dia sim dia não, ao retornar do trabalho ao final da tarde.

Todos os dias, de segunda a sexta-feira, em torno das 7h40 da manhã ele abria a porta simples de sua casa simples e, inibido com o desconforto de se sentir observado, olhava disfarçadamente para o clarão da rua. Receoso de ter que responder bom dia logo ao amanhecer, trancava a porta, retirava a chave, e nunca deixava de empurrá-la para se certificar de que estava realmente trancada. Repetia o mesmo processo ao retornar do almoço para o trabalho, todos os dias a mesma coisa, sem qualquer mudança. Ali estava ele: um homem elegante.

Apesar de possuir uma leve curvatura na coluna, pescoço curto e a cabeça inclinada para o lado, tinha uma postura elegante. Era magro, alvo, estatura mediana, e possuía cabelos negros e lisos, sempre bem penteados. Nenhum fio de cabelo parecia fora do lugar, eis uma de suas características mais marcantes. Ele, o homem elegante, usava, todos os dias, calças de linho, camisas de algodão, um paletó azul marinho, periodicamente substituído por um de cor preta, sapato social preto, criteriosamente limpo, e nunca deixava o seu guarda-chuva em casa, não apenas por precaução contra o sol e os raros dias de chuva. Todas as roupas revelavam o tempo e o excesso de uso, tão gastas, mas sempre usadas como se adquiridas recentemente. Ao contrário dos sapatos, gastos mas bem limpos, as camisas traziam em seus colarinhos marcas de suor enegrecido pelo pó da pele, sempre a mesma camisa no decorrer de cada semana. Desde muitos anos atrás, nunca mais uma roupa nova, nunca mais uma peça a mais, nunca precisava de nada a não ser alimentos regados, a luz de baixa voltagem, a água, a escuridão da noite a ouvir o seu silêncio, e uma coisa e outra quase despercebidas. Tudo tão estático em seus desejos.


Depois de certificar que a porta estava fechada, subia a rua de sua casa, a mesma rua de seu local de trabalho. Três quarteirões depois, e sempre à direita, atravessava a rua que dava acesso a um pequeno jardim da cidade, prosseguia em sua calçada, novamente atravessava a rua, e na esquina adentrava em seu trabalho. Na sala, compartilhada com mais dois funcionários, retirava o paletó, usado sem ser exigência de sua função, pousava no encosto da cadeira, retirava o relógio de corrente do bolso da calça, e sentado com as mãos sobre a mesa, aguardava que os ponteiros marcassem 8h00 da manhã. Então, iniciava o seu meticuloso desempenho com a sua caligrafia impecável. Era um artista ao protocolar e registrar com as suas letras e palavras rebuscadas o cumprimento de seu ofício.

Desempenhava eximiamente as suas funções, falava apenas o necessário, e, apesar de gentil quando a ele recorriam, nunca desenvolveu amizades no trabalho, nem no percurso de casa, nem na feira, nem na padaria. Nunca alguma visita em sua casa, desde muitos anos atrás, e nunca aceitava convites a ele feitos, desaparecidos com o decorrer do tempo. Na confraternização de final de ano, apenas uma vez ele esteve presente durante os quase vinte e cinco anos de trabalho. Uma vez, para nunca mais. Ele ainda tão jovem. Sentiu-se tão deslocado, muito mais inibido. Sentiu-se um inseto, depois um homem se transformando num inseto, numa barata, uma lagarta escorregando num lamaçal, ele uma ave de asas atrofiadas num esforço imenso de voar para qualquer lugar que fosse longe, distante; vontade de estar em seu quarto empilhado de tantas coisas desnecessárias, ele, ele mesmo com tanta vontade de sair correndo daquele lugar, e desapareceu. Desapareceu para nunca mais qualquer que fosse a confraternização.

Era um sábado quando ele relembrou aquele dia. Naquele dia, e não apenas por causa disso, ele não abriu a porta de casa, não foi à feira, não apareceu na janela, e nem foi paisagem estática e de olhar misterioso diante do pequeno mundo lá fora. Passou o dia inteiro transitando em poucos movimentos pela casa, de um lado para outro em seus pequenos e poucos compartimentos: a sala, os dois quartos, a cozinha, e um quintal quase do tamanho da casa inteira. O dia inteiro transitando diante dos reflexos das paredes de tintas envelhecidas, o tempo encardido nos móveis, na toalha sobre a mesa, nas fronhas e nos lençóis, e três antigas fotografias em preto e branco em suas molduras empoeiradas, fincadas na parede da sala: a casa inteira empoeirada, o cheiro de tempo abafado, mofado, envelhecido dentro dos guarda-roupas, dentro das gavetas, detrás de cada coisa e de cada pensamento naquela casa. Naquele dia, algo lhe apertava o peito: cansaço, fadiga, o afeto dolorido, o amor dolorido, o corpo inteiro dolorido. Então, ao final da tarde, depois de um longo tempo sentado em seu quarto, se dirigiu até o outro quarto, onde a porta permanecia sempre aberta. Ali, sentou na poltrona de frente para a cama e ficou a contemplar o rosto daquela mulher envelhecida pelo tempo. Tantos anos!

Tantos anos e ela prostrada naquela cama. Ele, todos os dias, estava ali ao seu lado, presente, entregue muito mais que a si mesmo. Permaneceu sentado como de costume, e o silêncio começou a se aprofundar ainda mais naquele quarto, enquanto as suas raízes germinavam em todos os cantos da casa. Poucas, bem poucas palavras, reduzidas e mais pausadas com o decorrer do tempo. E, com o tempo decorrido, era agora palavras em devaneios, o olhar estabelecendo diálogos, o olhar parado diante do teto, diante do vazio, diante de alguma lucidez que apenas ela sabia se ainda havia. Ele sentia tanta vontade de saber se ainda havia nela alguma lucidez! Às vezes, ele desejava que sim, e muitas vezes ele desejava que não. Preferia que ela não se apercebesse ali, prostrada naquela cama durante anos; preferia que ela não sentisse a sua nudez invadida, ela sempre tão recatada, e ele levado e despi-la, elaborando habilidades para que nunca precisasse encarar a sua nudez mais íntima. Nunca! Ele tão constrangido e recatado com a própria nudez.

Depois de pensamentos entrelaçados no tempo, ele se levantou, se aproximou da cama, olhou com suavidade o seu rosto, e contemplou aquele olhar tão suavizado naquele instante. Ele teve uma sensação que lhe foi tão estranha: vislumbrou um azul marcante em seus olhos, eles em movimentos suaves como os de nuvens calmas, o quarto cheio de nuvens. Tomado por um sentimento de esvaziamento, ajoelhou diante da cama, pegou em uma de suas mãos, permaneceu olhando para o seu rosto, a noite iluminada pela luz fraca amarelada, e ali ele cochilou não mais que cinco minutos. Sonhou, despertou, olhou atentamente o seu rosto, levantou-se, olhou-a ainda mais atentamente, e então colocou as suas mãos uma sobre a outra e saiu do quarto.

Ao amanhecer, ele abriu a porta do fundo da casa, recostou-se na parede, o tempo ainda enegrecido e revelando os primeiros sinais de luminosidade! Tudo ainda turvo, lá fora e lá dentro dele. Não dormiu naquela noite. Um cansaço, um enfado, mas, mesmo assim, ele sentia uma serenidade caindo como gotas ao final de um temporal. Todo temporal cessa, ele pensou, naquele dia que parecia nunca mais acabar. Todas as horas cessam, ele pensou, logo em seguida. Ele, sem saber se seria melhor que o dia acabasse logo ou se durasse o tempo de vários anos, permaneceu encostado ali na parede, observando a noite partir de vez. E o dia surgiu numa luminosidade radiante.

Na segunda-feira, às 7h40 da manhã, ele abriu a porta da casa e surgiu em seu paletó preto. Pela primeira vez, não trazia consigo o seu guarda-chuva. Ele, elegante em sua roupa bem gasta, iniciou o seu percurso habitual. Ao percorrer o jardim, olhou para o alto, o Céu bem no alto, atravessou a rua, entrou em sua sala de trabalho, colocou o relógio sobre a mesa, e em seguida pousou também as suas mãos. Estático como uma fotografia e numa paciência que lhe era comum, aguardou que os ponteiros marcassem, pontualmente, 8:00 da manhã.