tag:blogger.com,1999:blog-74062808629617443602024-03-13T08:13:11.511+00:00"O Silêncio e a Bagagem" Silence and Luggage Stille und Gepäck Silence et bagages"[...] a mala se esvaziando, a mala se esvaziando, veementemente se esvaziando, sem nem mesmo alguma peça de roupa ter sido, pelo menos, dobrada e guardada dentro dela. A mala ainda vazia, completamente vazia, e já se esvaziando, se esvaziando, o fundo, o fundo da mala tão escuro de tamanha profundidade, e totalmente escancarado para o nada. Nada ali dentro da mala que seria tão pequena para o tanto a ser transportado, e o denso cheiro de vazio dentro da sua imensidão."I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.comBlogger261125tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-36079744509138007832023-05-11T19:52:00.001+01:002023-05-11T19:52:54.213+01:00Felicidade Provisória - Contos - 2020<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEicQi7UahW2XUY0HLRftUWNt1MdUcZT8nruw3TE8EG7uB3t0b2X_FoCUceaiLg7ggFyB6pmVWzFb8MAylycXWD2KDdLK4rHFnwatehvytN6oXGMzstWhHziXCJZHirF5doKWcPfX2HF6T_gwI90sLngVCszLeIqZK0Kwl_4d7_4wUP4s4JDWTfVGOGM/s1280/thumbnail_CAPA_felicidade%20provis%C3%B3ria-ebook.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="320" data-original-height="1280" data-original-width="800" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEicQi7UahW2XUY0HLRftUWNt1MdUcZT8nruw3TE8EG7uB3t0b2X_FoCUceaiLg7ggFyB6pmVWzFb8MAylycXWD2KDdLK4rHFnwatehvytN6oXGMzstWhHziXCJZHirF5doKWcPfX2HF6T_gwI90sLngVCszLeIqZK0Kwl_4d7_4wUP4s4JDWTfVGOGM/s320/thumbnail_CAPA_felicidade%20provis%C3%B3ria-ebook.jpg"/></a></div>
</div> Impresso e e-book. AmazonI. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-80657265420091358972023-04-25T15:27:00.000+01:002023-04-25T15:27:18.823+01:00Um abraço pela metade<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjF1kxQMmThsa6_YUcvlC0AL50kkzvjsihbyAO8lCoJDC0_yB5Eo-9VMbfSaFbq4SjMY2tpuc1anh9N7PjGAZrvbBsJxUwvF-Xyk-7MP9_BTguJrK4NGynp_GCJ95fny2xHo5ucbytEkoG-7rBVrtk3iu48JQWQUROWinXBxfUGKdcX7N5gsZ0BByht/s1600/O-SILENCIO-E-A-BAGAGEM_quadrado.png" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" width="400" data-original-height="1600" data-original-width="1600" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjF1kxQMmThsa6_YUcvlC0AL50kkzvjsihbyAO8lCoJDC0_yB5Eo-9VMbfSaFbq4SjMY2tpuc1anh9N7PjGAZrvbBsJxUwvF-Xyk-7MP9_BTguJrK4NGynp_GCJ95fny2xHo5ucbytEkoG-7rBVrtk3iu48JQWQUROWinXBxfUGKdcX7N5gsZ0BByht/s400/O-SILENCIO-E-A-BAGAGEM_quadrado.png"/></a></div>
<br /> Abriu a porta bem devagar com aquela saudade dentro do seu peito, guardada desde quando há dez anos havia partido para voltar no mês seguinte. Abriu a porta bem devagarinho, com aquele desejo guardado no coração. O desejo de fazer-lhe uma surpresa com o seu abraço e com os seus olhos cheios de emoção, e correndo para os seus braços, sem desgrudarem os olhos um do outro, e aquele calor em seu peito, sem precisar de palavras para dizer eu te amo e eu te amo também.<br />
<br /> Abriu a porta com aquele suspense retido no coração, uma aflição por não saber se ainda era esperado, e um impacto grudado em suas bruscas recordações: o menino correndo pra lá e pra cá, hora da merenda das três horas da tarde, café com leite, pão com manteiga, fatias de bolo de laranja, qualquer coisa que anunciasse que dali a pouco seria a hora do banho, a tardezinha chegando, e os seus sonhos que rompiam até mesmo a escuridão da noite. Foi bem deste jeito. Pensamentos tumultuados por acontecimentos, e não sabia mais como se controlar frente ao encantamento.<br />
<br />Ficaram ali abraçados sem dizer uma palavra sequer. Apenas aquele suspiro tão fundo e carregado de espanto pelo que parecia nunca mais acontecer. As pernas se batiam umas nas outras, os corações se empurravam pra lá e pra cá, e os rostos quase um queimando o outro.<br />
<br /> Ficaram abraçados naquele estado de comoção até que ele percebeu que o abraço que lhe acolhia foi aos poucos, bem aos poucos mesmo, se soltando dele e o coração deixando de pulsar junto do seu. Ele com tanto desejo de se manter acolhido, ao menos por mais um pouco de tempo, mas ela olhou dentro dos seus olhos, com uma dor escondida durante tantos anos, e, numa atitude inesperada, olhou ainda mais fundo, deslizou os seus dedos sobre o seu peito, recuou-se, lentamente, e num gesto brusco o empurrou para trás, desfazendo de uma só vez todo o abraço guardado durante dez anos.<br />
<br /> “Desgraçado!” Ela disse, com um olhar melancólico. “Por todos estes anos, você só pensou em você mesmo, e desconheço a sua saudade. Suas palavras foram sumindo, suas palavras foram sumindo, suas palavras foram sumindo até que sumiram de vez no meio de tudo que foi sendo encontrado lá fora. E eu aqui grudada no telefone, e grudada na sirene, e grudada no correio que nunca mais chegou.”<br />
<br /> E ele, sabe-se lá se coitado, entalado com o abraço cortado pela metade, ficou ali parado com os braços entreabertos, enquanto ela se afastava olhando em seus olhos e repetindo as mesmas palavras e outras que ele já nem conseguia definir o que diziam. Ela continuou afastando-se até que as suas costas bateram na mesa, e ela virou-se de costas e arrancou as flores artificiais que havia dentro daquele jarro de vidro transparente e as jogou em seus próprios pés. Logo em seguida, pegou o jarro e, com veemência, o lançou aos pés dele, que permaneceu sem dizer uma única palavra sequer.<br />
<br /> A mala bem ali ao seu lado. Uma bagagem desconhecida, quem sabe um presente que demonstrasse que em algum momento ela havia sido tão lembrada naquela terra que, para ela, era terra desgraçada, terra que encantava e roubava sentimentos alheios. Ela olhava para aquela bagagem, pequena demais para quem esteve fora desde uma década atrás, e, enquanto isso, ajoelhou-se, apertou a cabeça entre os seus braços, e deu um grito tão alto que ele achou que fosse grito de doido.<br />
<br /> “É grito de doido!” Ele pensou, apavorado pelo risco de ter trazido de lá de fora a loucura para dentro daquela casa. A boca travada, a cabeça novamente cheia de recordações: o café com leite derramado sobre a mesa, a orelha vermelha igual a brasa, ele injustamente levado ao castigo, e aquele choro sem fim.<br />
<br /> O grito que ele já imaginava ser grito de doido encheu toda a casa e pulou janela afora. Ele deu um passo à frente, e parou quando ela deu um passo para trás. Foi neste momento que ela olhou bem mais dentro dos olhos dele, levou as mãos até a gola do seu vestido e o rasgou de cima a baixo, expondo toda a sua nudez guardada por tantos anos.<br />
<br /> Ela andou direção a ele, sempre em passos lentos, abaixou-se diante dos seus pés, pegou sobre o chão um dos cacos do jarro, retornou alguns passos, ele atônito, ela controlando todos os olhares, e, de uma só vez, apertou, dentro das suas mãos, aquele caco pontiagudo. Ele, trêmulo, levou as mãos ao rosto, tornando turva a sua visão, enquanto ela foi em direção à porta, ainda aberta, e saiu em passos longos pela rua afora.<br />
<br /> Mais cinco anos se passaram. Mas ele, sempre silencioso, nunca deixou de visitá-la naquele quarto cheio de medicamentos, nem de acariciá-la quando ela permitia, e nem de levá-la para passear por aquele jardim tão arborizado, embora o ache tão sombrio.<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-14747866621178747422023-04-25T12:53:00.003+01:002023-04-25T13:04:01.079+01:00"O silêncio e a bagagem" - Contos (Nova Edição 2020, Revista)<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkkdWEkoYzDpt51NozNxyH5TWMRad5msuxhW-jnSc4TEV6vP7ZZZ1aundqIKYU56gQOpWWBpIX8DZVIl_i30LHt7A8397_SBJfIjIqJMrgXJKBv9ktCn4_M44iEzWJA7fVJL3BBct4Lp0ojFexp_U-2XmJAPjGudzXYiy4xGDyQC9WsFmlvnZCSya2/s2560/CAPA_ebook.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="320" data-original-height="2560" data-original-width="1600" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkkdWEkoYzDpt51NozNxyH5TWMRad5msuxhW-jnSc4TEV6vP7ZZZ1aundqIKYU56gQOpWWBpIX8DZVIl_i30LHt7A8397_SBJfIjIqJMrgXJKBv9ktCn4_M44iEzWJA7fVJL3BBct4Lp0ojFexp_U-2XmJAPjGudzXYiy4xGDyQC9WsFmlvnZCSya2/s320/CAPA_ebook.jpg"/></a></div><div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjnUH8xEWf6ocVzVWvKipNI5RPac6lTUISl-aCKyhyGJE2glaTjcmagYh3dL88n7g_rH2wJ5kJWTKhjwqQsoqJNhB4n6xRFu8jo7_pw6-xtYj6ZvdcbryuCKEy6rE79bLAkouGpUeMVSLIuUukSuN8fRoQFJjPmk39PPRKrUdCD6H3e178sSTyKI8R_/s2560/CONTRACAPA_ebook.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="320" data-original-height="2560" data-original-width="1600" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjnUH8xEWf6ocVzVWvKipNI5RPac6lTUISl-aCKyhyGJE2glaTjcmagYh3dL88n7g_rH2wJ5kJWTKhjwqQsoqJNhB4n6xRFu8jo7_pw6-xtYj6ZvdcbryuCKEy6rE79bLAkouGpUeMVSLIuUukSuN8fRoQFJjPmk39PPRKrUdCD6H3e178sSTyKI8R_/s320/CONTRACAPA_ebook.jpg"/></a></div>
Capa: Nana Andrade - andrade.nanaf@gmail.com <br />
<br /> Apresentação <br />
<br /> Este livro – O silêncio e a bagagem - representa um espaço literário que convida o leitor para encontrar sentido e significado em seu próprio silêncio e em sua própria bagagem. Cada história apresenta uma riqueza de personagens e de detalhes do quotidiano, cada uma é única, porém há um fio condutor que parece unir todas as histórias: a voz da bagagem do mundo subjetivo que mundo exterior com seu movimento frenético e incessante tenta calar. I. Luiz Andrade revela a força brutal do mundo concreto que deseja de alguma forma suprimir os anseios mais intensos e relevantes do ser humano. A realidade com seus infinitos e por vezes insignificantes detalhes que insistem em desviar o olhar do próprio sujeito, da sua importante demanda interna para as resoluções práticas do dia a dia. O silêncio, tão marcante em todas as narrativas no livro, revela que o calar é também uma forma de viver e resistir aos inúmeros apelos da vida quotidiana. A bagagem que habita o mundo interior se recusa a aceitar todas as premissas que a realidade exige e o silêncio é momento de soberania do sujeito, esse feixe de emoções quase totalmente subjugado aos acontecimentos da vida. <br />
<br /> I.Luiz Andrade trabalha em sua escrita de forma única justamente o quase, aquilo que quase é dito, que quase é feito, que fervilha nos pensamentos dos seus personagens e toca assim a forma de ver e estar no mundo do leitor. <br />
<br /> A vida concreta dos personagens, o dia a dia, os afazeres tentam calar a força torrencial do mundo interno. É justamente a sutileza e o mistério que habitam o mundo subjetivo dos personagens que é explorado pelo autor do livro, que percorre com maestria os labirintos interiores que estruturam os sujeitos fictícios que na verdade representam os sujeitos reais que somos todos nós, que também experimentamos diariamente essa luta entre a voz ininterrupta da realidade em contraste com a importante voz interior. É justamente no momento de silencio, de pausa, de um certo vazio, que os personagens percebem que há algo para além do concreto, algo que estrutura e preenche a existência humana. Algo que dá sentido e dignifica a caminhada de cada um com o seu silêncio e a sua bagagem. <br />
<br /> I. Luiz Andrade mostra toda a fragilidade que é constituinte do ser humano: o medo, o tédio, o desejo, a tristeza, a competição. As falhas internas são expostas justamente nos momentos de silencio, nas pausas que a vida involuntariamente proporciona deixando as personagens e o ser humano à deriva, mostrando que todas as redes de segurança são construtos artificiais que nos ajudam a lidar com o grande caos que é existir. <br />
<br /> Esse livro é um convite para que o leitor conheça melhor todos os recantos da sua subjetividade: aquilo que nos alegra e que nos cala, aquilo que nos fortalece e aquilo que nos amedronta, aquilo que nos faz suspirar e aquilo que nos fazer ter receios. <br />
<br /> As belas narrativas proporcionam um mergulho intenso na interioridade humana, mostrando toda a sua potência e todas as suas fragilidades, a promissora possibilidade de completude e a marca da falta, do vazio, daquilo que é impossível nomear e que mora no mais profundo de todo ser humano. <br />
<br /> Trata-se da segunda edição de O silêncio e a bagagem. A primeira publicação ocorreu em 2008. Após mais de uma década, o autor decidiu presentear o leitor com uma nova edição, tão instigante como a primeira, pronta para transformar a vida do leitor, pois uma excelente leitura como essa que o livro nos proporciona, torna o nosso mundo mais vasto, mais amplo, as perspetivas do nosso olhar ganham novas cores e nuances. A realidade interna e externa ganham outras e incríveis proporções a partir da leitura das narrativas presentes neste livro. <br />
<br /> Cláudia Souza. <br />
<br /> Lisboa, Outono de 2020. <br />
<br /> Instagram: claudiafernandopessoa <br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-89037198622798105022021-03-08T11:11:00.005+00:002021-03-08T11:29:41.238+00:00"Fragmentos do diário de Martha B." <div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg08FtuNPhq4k6b4IAVuLUdJn-5ciFLnaZ-G1fwKYe_iWae_Hf7HJnLmDvPiIlyD7PNVxcOeVJIVzh_Zhb0T7c-_VUvLAFQJq-euBxsJTd6e6CrWsNezysENXgozxnC42FKaZ__yMRc_xs/s499/Fragmentos+do+di%25C3%25A1rio+de+Martha+B.+CAPAc.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="400" data-original-height="499" data-original-width="333" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg08FtuNPhq4k6b4IAVuLUdJn-5ciFLnaZ-G1fwKYe_iWae_Hf7HJnLmDvPiIlyD7PNVxcOeVJIVzh_Zhb0T7c-_VUvLAFQJq-euBxsJTd6e6CrWsNezysENXgozxnC42FKaZ__yMRc_xs/s400/Fragmentos+do+di%25C3%25A1rio+de+Martha+B.+CAPAc.jpg"/></a></div><div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgl0IQ_oznmQhYEgEzvtbTX_Xh52Vr3AoJmETPeuHtPYjodI6izZIHaw2Im5_89PgiVwOUYhqK18iu74kEc5hqxDW4J-yFeyh8w8dlpsN9_A5rQbXCcMp0tkPRKfUqNvbLxF2Y_vD4TRRU/s500/Fragmentos+do+di%25C3%25A1rio+de+Martha+B.+CAPA+NOVA.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="320" data-original-height="500" data-original-width="331" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgl0IQ_oznmQhYEgEzvtbTX_Xh52Vr3AoJmETPeuHtPYjodI6izZIHaw2Im5_89PgiVwOUYhqK18iu74kEc5hqxDW4J-yFeyh8w8dlpsN9_A5rQbXCcMp0tkPRKfUqNvbLxF2Y_vD4TRRU/s320/Fragmentos+do+di%25C3%25A1rio+de+Martha+B.+CAPA+NOVA.jpg"/></a></div>
Capa: Gustav Klimt, Apple Tree <br />
<br /> Publicação: Subterrânea Colectivo <br /><br />
<br /> Prefácio: Roberto Nicosia* <br />
<br /> “<i>In questo squilibrio del dubbio, come per gli orologi sciolti di Dalì, la scrittura di Martha B. diventa liquida e pervasiva, la divagazione apre le porte ad una dialettica i cui termini di confronto sono basati sul principio di negazione della memoria</i>.” <br />
<br /> Projetada pela escolha que está para além de uma personalidade monolítica – o gênero diarístico é a melhor sedução da alma por um desejo em constante movimento –, o drama conflituoso de quem quer entender os sinais opacos dos eventos interiores se traduz, por Martha B., em pura capacidade criativa, à qual não é necessário compreender, mas sobretudo conectar-se: “Portanto aqui me desprendo da ordem das palavras e do pensamento, ordem no sentido de sequência”. A sua viagem através da memória é uma mala desfeita sempre no ponto de ser fechada, entretanto, pronta para uma partida futura. Se não único, todavia claro, resulta o argumento principal de quem inicia e se prepara para a leitura deste memorial: o senso de fuga e da labiríntica procura é sempre presente. <br />
<br /> No desequilíbrio da dúvida, como pelos relógios dissolvidos de Dalí, a escritura de Martha B. se torna líquida e pervasiva, a divagacão abre as portas a uma dialética cujos términos de confronto são baseados sobre princípios de negacão da memória e da reflexão. Simon, Gael, vó Antonieta, a mãe, o pai, o irmão, Alzira, Catarine, e outros, bem como os objetos recorrentes (a janela do próprio quarto, a árvore etc…), diante da lente de uma análise prolongada por dias e meses, passam a ser figuras e emblemas de uma complexa galáxia narrativa contra cuja voz da protagonista se modula e se fragmenta em regatos e meandros. <br />
<br /> Como um vidro despedaçado, a vida, ou melhor, as vidas de Martha não conseguem preencher o abismo dos seus próprios fragmentos. As próprias cartas do diário são uma sucessão de registros clínicos que imprimem a presença inquietante de um estado de melancolia, mas sobretudo o desejo de um mapeamento artesanal do próprio ser – consciente/inconsciente – em continua expansão e, por isto, impossível de se conter, torrencial. <br />
<br /> Exatamente na procura das fronteiras, o centro resulta em um vazio (simbolizado na infinitude do deserto ou do silêncio), dentro do qual Martha B. escava os contornos dos fatos e das emoçōes, operando como um escultor cuja tarefa é extrair da matéria o perfil do representado: em tal atividade, nada pode ser desconsiderado, nem mesmo o não ser, que necessita de uma definição para exorcisar o risco do vazio, a negação própria de um diário. <br />
<br /> É nesta infatigável tentativa de compreender a si mesma que Martha B. chega a se opor ao otimismo da palavra (repetida, alternada, rima imperfeita, reagrupada em lexemas), o que desempenha um papel fundamental na sintaxe dos pensamentos. Uma sintaxe repensada que, à forma dialética tradicional de tese-antítese-síntese (circular e fechada), opõe-se a um binômio aberto: uma vez introduzido o tema do dia, Martha se abandona a testar as lógicas convencionais sem jamais se interessar com a conclusão. O resultado é um efeito de não-acabado, de absoluta casualidade, de reverberação que lança o leitor em direção a ulteriores reflexões e espaços narrativos. <br />
<br /> É exatamente aqui, para mim, que está a essência do livro de I. Luiz Andrade: as faces, os silêncios, os desertos, as angústias, as inquietações, ainda que mil vezes abordadas pela lúcida loucura de Martha, e que não podem nunca serem definidas em casos, porque o caso limita, enquanto Martha B. continua a viver na pulsão da sua procura, e a procura de todos nós que estabelecemos um diálogo com Martha. O sentido daqueles espaços deixados à nossa divagação, entre dias e dias, entre parágrafo e parágrafo, entre palavra e palavra, estendem um corredor que necessita da nossa experiência para completar-se e fechar-se em circuito a duplo fluxo, no qual o dar e ter são diretamente proporcionais à nossa necessidade de ver a profundidade deste vasto espelho emocional e psíquico. <br />
<br /> Fragmentos do diário de Martha B. é um livro imprescindível para quem procura na escritura uma chave interpretativa do ser e a sua evolução. Não tem nada de superficial neste movimento espiral que envolve a palavra, a frase, a respiração dos parágrafos, o ritmo dos sons, as discrasias, a presença inevitável do corpo e dos sentidos, os sonhos, as lembranças, e os símbolos de uma protagonista que evoca no nome a tradição bíblica da vida ativa. O diário de Martha B. é, portanto, um pretexto para qualquer um de nós que queira penetrar ativamente nos esconderijos de uma alma feminina e no universo psíquico em geral, onde, como no mito platônico da caverna, nutre-se de sombras refletidas para iniciar a própria busca da verdade. Buona lettura. <br />
<br /> *Tulane University - New Orleans - EUA <br />
<br /> ...
<br /> Disponível nas versões e-book e física. www.amazon.com.br - www.amazon.com - www.amazon.es e demais lojas Amazon. <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao/i-luiz-andrade <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-20702584827594359012021-03-01T11:21:00.008+00:002021-03-08T11:38:35.491+00:00"Quase jardins" - Romance<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiW37z16d8LxBS5m36Myz9RO__3M0J8QddoKOrTVYkXNQlHATZ7r3nCzQCiwccieTkpF3po0lNj-HjChJLkSSEmF9CKx4fWend63c0bv_rZbX96K82ISXV0IuhnjzfAlEHaptO6JBi65UU/s500/Quase+Jardins+CAPA.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="400" data-original-height="500" data-original-width="333" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiW37z16d8LxBS5m36Myz9RO__3M0J8QddoKOrTVYkXNQlHATZ7r3nCzQCiwccieTkpF3po0lNj-HjChJLkSSEmF9CKx4fWend63c0bv_rZbX96K82ISXV0IuhnjzfAlEHaptO6JBi65UU/s400/Quase+Jardins+CAPA.jpg"/></a></div>
<br /> Capa: Nada Andrade <br />
<br /> Revisão: Eneida Moreida de Brito <br />
<br /> Edição: Subterrânea Colectivo <br />
<br /> <b>Apresentação</b>: Cláudia Souza* <br />
<br /> <i>Quase jardins</i> é o romance do premiado escritor I. Luiz Andrade. Redigido entre os muitos jardins de Lisboa, de Esmoriz e da cidade de Porto, o texto conduz o leitor aos labirintos da reflexão. É uma história sobre o silêncio e a solidão. Uma solidão complexa e densa, uma solidão vivida em família. <br />
<br /> O romance está construído em torno de quatro personagens principais que, no desenrolar do texto, se transformam em vários outros e por vezes se misturam, como é o caso de José do Lago e de Júlio. As palavras que deslizaram das mãos atentas do escritor buscam e encontram no leitor representações que o habitam: a mãe, o pai, o filho, a filha, a existência, a loucura, a linguagem e as águas… Águas que unem e separam vidas, intimidades, vontades, verdades. Águas que aparecem depois que o sol se põe, quando tudo fica paradoxalmente mais claro, mais nítido. O dia, no romance, traz uma outra lucidez, perigosa, arriscada como toda lucidez, que pode conduzir o ser à loucura e aos seus arredores. <br />
<br /> Trata-se de romance polifónico, no sentido bakhtiniano do termo, todas as personagens têm o mesmo brilho, a mesma força. A escrita do texto foi construída de tal forma, que ao caminhar pelos capítulos muitos horizontes se desdobram. Não há um centro único e intocável, há o deslize, há o encanto, há um campo de possibilidades. Se o autor está morto, como afirmaria Barthes, Foucault e tantos outros pensadores, não podemos afirmar. Podemos apenas dizer com alguma certeza que o autor principal do texto é o próprio texto, dialógico e polifónico, como cada um de nós, e por isso o romance é tão envolvente e tão sedutor. O responsável pelo gesto que gerou a escrita foi acima de tudo artista, soube usar com maestria cada palavra, soube articular a linguagem de tal forma que a entrega do leitor é inevitável. <br />
<br /> <i>Quase Jardins</i> é um título muito oportuno, pois são muitos os jardins do romance. Existe um jardim infantil, fruto de fortes e distantes lembranças de um adulto. Esse mesmo jardim é o palco de alucinações infantis, de desejos, de sonhos. O outro jardim fica na outra margem do rio, num lugar imaginado ou real? O autor deixa essa questão para o leitor. Um jardim também de alucinações, de medo, de apreensão e de muitos encontros. A grama verde, as árvores, os muitos remédios, o banco…o banco do jardim, um convite à partilha. O vasto jardim do psiquismo humano é amplamente trabalhado no texto. <br />
<br /> A escrita, a linguagem, esse grande Outro do romance foi construído de tal forma que o silêncio também é parte fundamental do texto. E através do silêncio, que compõe o texto, o leitor vai se tornando artífice da história, ele também constrói o romance. As palavras que habitam o mundo há tanto tempo, vão à medida que as páginas são viradas, fazendo eco, conduzindo o leitor por belos e complexos jardins. O silêncio ruidoso do texto penetra no psiquismo do leitor trazendo a leitura por caminhos quotidianos e concretos: Júlio, Helena, José e Mariza aparecem na real mesa de jantar, na cabeceira, nas ruas, revelando uma mistura entre o real e a ficção. <br />
<br /> O estilo do romance é impecável, a articulação entre todas as palavras, todos os factos, todos os personagens. Uma escrita sobretudo fluida – que, como a água, passeia entre muitos lugares, entre muitos significantes, entre muitos jardins. E as personagens quase dizem tudo, quase são todos protagonistas, quase são todos permeados pela loucura e é neste quase que está toda a beleza da narrativa. O quase dito, o semi-dito, a verdade que nunca é toda, nunca é inteira, somente quase. Mariza é quase uma mulher perfeita, Júlio é quase feliz, José é quase um ótimo pai e Helena é quase autossuficiente. Esse quase traz uma sabedoria e encanta o leitor que é quase escritor, quase intérprete, quase inteiro, quase verdadeiro, quase louco. <br />
<br /> Tornar o leitor participante ativo do romance quer dizer que só resta uma certeza: o escritor nunca foi quase. Ele foi inteiro na sua transpiração e na sua inspiração para escrever, pois só diante de uma inteireza maciça havia a possibilidade de construir todos os quase que habitam o romance. <br />
<br /> Além das personagens já citadas, encontramos também a figura de uma avó, uma personalidade que tem um importante papel no núcleo familiar. Uma avó construída através de uma fértil imaginação, ela realmente existiu? Quando a personagem da avó ganha força uma pergunta se faz presente: o que é de fato real, e o que é construção de uma mente fantasiosa? Uma mente que é capaz de realizar muitas viagens, quase verdadeiras, quase em segundos, num momento em que a chave roda na fechadura, num momento de distração, num momento inesperado. <br />
<br /> Um outro aspecto muito interessante no romance é o olhar. A narrativa do romance é estruturada sobretudo a partir do olhar. Como no parágrafo inicial do primeiro capítulo, no qual um dos personagens, sentado num degrau, contempla “a paisagem nítida das coisas”, “tudo tão indecifrável”. O olhar, a água, a linguagem, forças incontroláveis que permeiam o romance. A água com sua força depurativa e misteriosa. O olhar dos personagens que busca decifrar o indecifrável. E a linguagem essa grande rede sobre a qual estamos estendidos todos e todos os personagens que Quase Jardins invoca. <br />
<br /> Depois de iniciada a leitura de Quase Jardins o leitor começa a contar o seu próprio romance. O texto é altamente sedutor e foi elaborado com tal perfeição que o leitor não só se envolve com os personagens, como os personagens se envolvem com o leitor. Ou seja, é um romance que altera a sua visão do mundo e de si. O poder da escrita, da utilização da linguagem é elevada ao máximo grau, de tal forma que se torna impossível não estabelecer um pacto com a narrativa e permitir que ela, na sua fluidez aquática, passeie pelas constelações mais belas e profundas que habitam a psique de cada um de nós. <br />
<br /> Júlio, Helena, Mariza, José esperam o toque do leitor, o manusear das páginas. Assim como o louco, que é outra personagem muito rico e bem construído, que entre seus muitos frascos de remédios exala sua intensa lucidez filosófica. Um louco que habita o cerne do conhecer, o centro do inapreensível, o centro do ser humano, tão cheio de nós, feitos durante uma pequena existência. <br />
<br /> <i>Quase Jardins</i> é uma obra-prima da literatura, uma obra grandiosa de um autor que traz na sua escrita um dizer único, um estilo ímpar e suscita no seu interlocutor muitas questões. É um romance que suspende o ar, que leva o leitor por recantos do existir, que exalta o grande Outro, a linguagem, lugar-comum, onde todos nós somos mestres e escravos, com a excepção do escritor, que através desta obra riquíssima mostra que em seu tecer com as palavras foi muito mais mestre. As muitas águas do romance precisam de movimento, precisam que o leitor, atento até agora a esse prefácio, inicie a sua viagem, única, reflexiva e instigante. <br />
<br /> *Doutora em Literaturas de Língua Portuguesa, Pós-doutora do Departamento de Filosofia da Universidade de São Paulo. Possui livros, capítulos de livros e artigos publicados no Brasil, na Europa e nos Estados Unidos. <br />
<br /> <b>Disponível nas versões e-book e física, em</b>: www.amazon.com.br, www.amazon.com, www.amazon.es e demais lojas Amazon. <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao/i-luiz-andrade <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-28327833354344429352021-02-25T15:29:00.015+00:002021-03-08T11:35:03.269+00:00"É o inverno, Leon" - Romance<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh0kkHJO3Xf850LJykcr3YwaAUv9YH9VvwvZCPbJctc9e3e2oKxVftlmF5M8FMkH1njfmyoh0ptkM3Vqjqf4F6FtEQ46WvSDHlZKffzXf_isByFoTUAWis02kqlI7aXkgDnHNeIrj2v5y0/s2048/CAPA_e+o+inverno+Leon-ebook+13DEZ2020.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="400" data-original-height="2048" data-original-width="1281" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh0kkHJO3Xf850LJykcr3YwaAUv9YH9VvwvZCPbJctc9e3e2oKxVftlmF5M8FMkH1njfmyoh0ptkM3Vqjqf4F6FtEQ46WvSDHlZKffzXf_isByFoTUAWis02kqlI7aXkgDnHNeIrj2v5y0/s400/CAPA_e+o+inverno+Leon-ebook+13DEZ2020.jpg"/></a></div>
Capa: <i>Nana Andrade</i> <br />
Revisão: Maria Cristina Mota <br />
Edição: Subterrânea Colectivo <br />
<br /> <b>Prefácio</b>: <i>Elis Crokidakis*</i> <br />
<br /> Em busca do verão. <br />
<br /> Com uma escrita frenética como se fosse um filme de ação, Leon é construído. Um personagem que não vem direto com uma descrição minuciosa de seu universo, ao contrário, ele vem aos poucos, em cada capítulo, sendo inventado. No entanto, há elementos que são presentes em todo o texto, pois em todos os capítulos vemos a angústia de Leon, sua fragmentação, seu devaneio. <br />
<br /> Camus, em “O estrangeiro”, coloca-nos diante de um homem que parece não ter sentimentos, para quem tanto faz como tanto fez, ao contrário é Leon, este tem excesso de sentimentos, de sensações, de saberes que o confundem e não o deixam com a mente clara. Nem um nem outro são o ideal. Talvez o caminho do meio nos soasse como algo mais tranquilo, mas como no atual estágio em que se encontra a humanidade isso é cada vez mais difícil. Acordamos e tudo já aconteceu enquanto dormimos, os meios de comunicação que nos aproximam também nos distanciam e a cada momento são maiores os índices de extrema solidão, mesmo que sejamos os mais conectados. Talvez seja isso que I. Luiz Andrade nos queira dizer. E diz por sua forma mais intensa, mais cortante, que por vezes se faz necessário parar de ler para não sucumbir às sensações. <br />
<br /> Quem é Leon? Quem é Nara? Quem é Laura? Quem é Lílian? Quem somos todos nós na loucura do viver? Talvez seja essa a grande pergunta do livro. Todavia ela é apressada, não dá trégua ao leitor, que ao ler fica sufocado. A velocidade das palavras em parágrafos curtos e as descrições dos espaços marcados por meios de transporte fazem o leitor sentir que precisa se deslocar, sair da mesmice para não se consumir nas dúvidas, nos desencontros da vida, ao mesmo tempo em que busca o fio de Ariadne no labirinto de Creta.
A memória é o grande viés a percorrer a narrativa, ela vai e volta. Leon não entende como isso acontece, mas é assim que se dá. Talvez a memória seja, então, o grande labirinto que, na narrativa, necessita de um condutor para levar o fio. <br >
<br /> Mas e o enredo, a história, esta é menos importante que a forma de narrar. Posso ousar dizer que a escrita é também labiríntica e tudo se convergirá a um só enredo? Não creio. Cada leitor fará uma história diferente, na magia da arte tudo pode acontecer. “Viver ultrapassa qualquer entendimento”, diria Clarice Lispector, mas que vida é essa? Leon está em busca de si mesmo e vê em todos as explicações para si mesmo. É o inverno, sempre inverno, diz a mãe, diz Nara, diz Laura. Todo mundo diz, mas Leon não sabe sobre o seu sentir, ou seja, de que ordem são os seus sentimentos, e também não sabe o que sente. Mas sabe que o inverno está dentro dele em certos momentos de sua existência. <br />
<br /> A necessidade de entender a si mesmo e aos seus sentimentos truncados fazem ainda de Leon o próprio homem pós-moderno, solto no mundo, fragmentado e sem saber onde ir, aí ele se volta para o berço. No texto, é clara a presença da família, aquela que ele tem certeza que estará sempre ali para acolhê-lo. A mãe, a que mais o entende, a referência maior, o pai, o amor e o respeito, e os demais como um complemento para a identificação do que seria o seu verão. Ou seja, Leon está aí o tempo todo, nas ruas, nas salas de aula, nos transportes, em qualquer lugar. Ele representa, por fim, essa necessidade que todo ser humano tem de se sentir acolhido, amado para poder ser e não apenas existir. <br />
<br />
Villefrance de Rouergue, em setembro de 2019. <br />
<br /> *Doutora em Ciência da Literatura, com pós-doutorado em Literatura Brasileira. Professora de Literatura e Cinema da FACHA <br />
<br /> <b>Livro disponível nas versões física e e-book: www.amazon.com, www.amazon.com.br, e demais lojas Amazon.</b> <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao/i-luiz-andrade <br />
<br /> https://subterraneacolectivo.wixsite.com/apresentacao
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-35661328036782835872020-01-28T23:54:00.016+00:002021-02-25T17:09:42.640+00:00Palavras (in)visíveis<div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh9bhvfrpEy5V1H6vorRwOhbrPlfOUrk_S9lHHGfSbtjUMZGVb_JBvrbg8T8v0Owqtz-QSHZd_Bvy_JJen6sfqB-07fAmgUBSjJ-ifLDekk7QQYCnf5NLfmPT1rYBArYCeTqlqS4ssIBL4/s1932/Capa+Palavras+invis%25C3%25ADveis+frente.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="400" data-original-height="1932" data-original-width="1198" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh9bhvfrpEy5V1H6vorRwOhbrPlfOUrk_S9lHHGfSbtjUMZGVb_JBvrbg8T8v0Owqtz-QSHZd_Bvy_JJen6sfqB-07fAmgUBSjJ-ifLDekk7QQYCnf5NLfmPT1rYBArYCeTqlqS4ssIBL4/s400/Capa+Palavras+invis%25C3%25ADveis+frente.jpg"/></a></div><div class="separator" style="clear: both;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhs7ISh3cqZ_kQAUNUy4cM3QCYl8DP0RXmFNfvqIiYYQpF8zeBCcsBMwgbPdiEAEk_HKwduGVaXbMivb8ScSmIU6BF2j49gaGwh_5RRPqHwtnXZCaZR_7IL7FY1qk05vxIN78GDIQVZSKQ/s1986/Capa+Palavras+invis%25C3%25ADveis+verso.jpg" style="display: block; padding: 1em 0; text-align: center; "><img alt="" border="0" height="400" data-original-height="1986" data-original-width="1312" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhs7ISh3cqZ_kQAUNUy4cM3QCYl8DP0RXmFNfvqIiYYQpF8zeBCcsBMwgbPdiEAEk_HKwduGVaXbMivb8ScSmIU6BF2j49gaGwh_5RRPqHwtnXZCaZR_7IL7FY1qk05vxIN78GDIQVZSKQ/s400/Capa+Palavras+invis%25C3%25ADveis+verso.jpg"/></a></div>
<br /> Capa: Nana Andrade <br />
<br /> Desenhos: João Matos <br /> <br />
<br /> <b>Prefácio</b>, Nuno Ribeiro*<br />
<br /> O livro Palavras (In)visíveis de I. Luiz Andrade encontra-se estruturado em torno de dois temas que compõem esta obra poética: a potência plástica da palavra e a capacidade expressiva do silêncio. Com efeito, ao longo do presente livro existem múltiplas instanciações da potencialidade plástica que subjaz à “palavra”. Encontramos um claro exemplo disso no poema “Tempo das Palavras”, em particular nas duas primeiras estrofes deste poema, onde lemos:<br />
<br /> Palavras que mudam com o tempo
<br /> o sentido
<br /> a intenção.
<br /> Palavras que um dia tanto foram
<br /> que um dia tanto podem
<br /> não mais resistir,
<br /> inesperadamente. <br />
<br /> Palavras que mudam o rumo
<br /> de rumo
<br /> e deixam fragmentos
<br /> - às vezes, felicidades
<br /> imagens, lá dentro
<br /> um vento. <br />
<br /> De acordo com este poema, a palavra é constituída por uma natureza mutável. Conforme nos diz o autor, “as palavras mudam com o tempo”, numa progressiva alteração de “rumo”, isto é, numa constante divisão de sentidos abertos à criação de uma multiplicidade de mundos diversos que são potenciados por essa variedade de sentidos que a palavra pode assumir. É precisamente isso que lemos nos primeiros três versos do poema “A palavra, decisiva”:<br />
<br /> A palavra, diversos mundos
<br /> penetrante, mistérios tantos
<br /> divisora de sentidos. <br />
<br /> A palavra constitui-se, desse forma, como algo portador de um carácter ambivalente, isto é, pela capacidade simultânea de um “sim”, possibilitante de uma abertura a uma pluralidade de possibilidades, e de um “não”, inviabilizador dessa mesma proliferação de possibilidades. É, nesse sentido, que devemos ler os três últimos versos do poema “Juras”, que abre o presente livro: <br />
<br /> Pela palavra.
<br /> O sim.
<br /> O não. <br />
<br /> O “sim” e “não” que a palavra possibilita correspondem, por conseguinte, à potência plástica que a palavra tem de nos abrir e também ¬fechar o sentido das múltiplas formas de ser que nos são dadas a ver. Acompanhar a potencialidade plástica da palavra significa, dessa forma, ser capaz de encontrar palavras que expliquem as múltiplas variações do ser, as suas múltiplas possibilidades, conforme lemos na exortação presente nos seguintes versos do poema “Atos 5”: <br />
<br /> Quem sabe…
<br /> encontrar palavras
<br /> que expliquem as variações do ser. <br />
<br /> No entanto, paralelamente à temática da plasticidade da palavra, o livro Palavras (In)visíveis é constituído por uma evocação recorrente da dimensão expressiva do silêncio. Com efeito, para além da palavra enquanto abertura de uma pluralidade de possibilidades, este livro de I. Luiz Andrade apresenta-nos múltiplas possibilidades expressivas do silêncio. A importância do silêncio na construção poética de Palavras (In)visíveis é precisamente afirmada na segunda quadra do poema “Faces da Poesia”, onde se lê: <br />
<br /> Poesia é o silêncio, o olhar, o encontro
<br /> palavras girando na memória.
<br /> São os impasses da dor, fantasia
<br /> as cores do dia, coisas do amor. <br />
<br /> Este trecho estabelece uma explícita relação entre a “Poesia” e o “silêncio”, apontando para um carácter fecundo do silêncio enquanto portador de modalidades poéticas expressivas, tema que é evocado no poema “Silêncio (in)fecundo”, onde lemos: <br />
<br /> O silêncio das horas indecifráveis
<br /> as horas silenciadas pelas perguntas
<br /> sem respostas,
<br /> perdidas.
<br /> Falta de palavras,
<br /> elas que definem o vazio
<br /> - que não é infecundo. <br />
<br /> Toda esta evocação do carácter fecundo do silêncio, enquanto portador de múltiplas potencialidades expressivas, encontra um dos seus pontos culminantes no poema “Presença silenciada”, onde o autor nos diz: <br />
<br /> Alguns silêncios são desconhecidos
<br /> e tornam-se íntimos
<br /> a presença silenciada
<br /> sabe-se lá se outros amores
<br /> sabe-se lá se amores antigos
<br /> sabe-se lá se por nada. <br />
<br /> Alguns silêncios são conhecidos
<br /> sabe-se lá se um outro Eu
<br /> um que precisava existir
<br /> e nunca, <br />
<br /> sabe-se lá! <br />
<br /> Todos os elementos que temos vindo a apresentar permitem-nos compreender de que forma a poética de Palavras (In)visíveis se encontra alicerçada entre a expressividade do silêncio e a força plástica das palavras, ao mesmo tempo que nos possibilitam afirmar que este livro de I. Luiz Andrade se constitui como um importante contributo para Poesia de língua portuguesa. <br />
<br /> *Especialista no espólio de Fernando Pessoa e pós-doutorando do IELT – Instituto de Estudos de Literatura e Tradição –¬ (FSCH, UNL). Autor de edições e estudos sobre a obra de Fernando Pessoa, publicados na Europa, no Brasil e nos Estados Unidos. Coordena, em conjunto com Cláudia Souza, a «Coleção Pessoana» na Apenas Livros. Contacto: nuno.f.ribeiro@sapo.pt <br />
<br /> <i>Livro disponível nas versões ebook e física. www.amazon.com.br, www.amazon.com e demais lojas Amazon</i>.
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-25316131645296226132020-01-26T23:23:00.022+00:002021-02-25T17:22:35.188+00:00A ponte, apesar do rio<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;">
<a
href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhEC9mUoYrtpos6q5X4OxnT2_Vn3VmiAY3CltdZu__Yb-P4KjJLMYiFRKv3mOwzo9tCjWiYckUwTEPf3UnTFvv1jQneKfvuicb5jmISM9NPgUaSkx2SjPVQ2xB3pA1Y1xEQK1TotfJ5FeY/s1600/CAPA_a-ponte-apesar-do-rio_completo-02.png"
imageanchor="1"
style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"
><img
border="0"
src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhEC9mUoYrtpos6q5X4OxnT2_Vn3VmiAY3CltdZu__Yb-P4KjJLMYiFRKv3mOwzo9tCjWiYckUwTEPf3UnTFvv1jQneKfvuicb5jmISM9NPgUaSkx2SjPVQ2xB3pA1Y1xEQK1TotfJ5FeY/s640/CAPA_a-ponte-apesar-do-rio_completo-02.png"
width="640"
height="493"
data-original-width="748"
data-original-height="576"
/></a>
</div>
<br /> Capa: Nana Andrade. <br />
<br /> PREFÁCIO <br />
<br /> Sinuoso, inquietante e fugidio, tal qual o fluxo
caldaloso do rio, parecem-nos qualificativos apropriados ao livro de narrativas
“A ponte, apesar do rio”. São contos, pequenas narrativas, poemas e outros
escritos que, numa aparente desconexão, se entretecem com os fios luminosos de
genialidade e rebordam em palavras, metáforas e imagens inusitadas a unicidade
coesiva. Eis aí um traço marcante do jovem escritor I. Luiz Andrade, uma
tendência à experimentação de uma escrita literária sempre carregada da emoção
de criar, de inventar com palavras-pontes caminhos que ultrapassem os limites
margeados, tão repisados pelo gregarismo das rotas transitáveis e, portanto,
indesejáveis. Pois que a ponte, ao tempo em que fragmenta o rio, também o
interliga, aproximando suas margens. Interessante notar que a forma como autor
constrói as narrativas, guardando uma aparente independência entre cenas
narradas, a priori lidas como fragmentos, nos leva a perceber, numa leitura mais
atenta, que em todo o tempo estamos diante de uma unicidade estabelecida quer
seja pela ideia de complementariedade entre os títulos dos textos, ou pela
incidência temática que percorre a maioria deles, ou ainda pela repetição de
elementos, categorias ou conceitos-chave que aparecem reiteradas vezes ou mesmo
na tentativa de interlocução com o leitor, por parte do narrador, conforme lemos
no último parágrafo do primeiro conto “A ponte, apesar do rio I”: “(...) Não vê
que a ponte surge imponente e simples sobre o rio e assim constrói uma
unicidade?”(...). Esta imagem é retomada no conto seguinte:” (...) A ponte
permanecia esbelta e imponente(...)”. É a língua em sua função poética criando
pontes que possibilitam o trânsito de sentidos e aproximações polissêmicas. Pois
que a língua é ponte que nos liga às diversidades. Que nos transporta para
universos diversos, que nos permite decifrar o enigma da esfinge e não sermos
devorados. E é esta destreza com a língua portuguesa, especialidade de I. Luiz
Andrade, ele que é Doutor em Literatura de Língua Portuguesa e professor, e
cronista e poeta e contista, é esta familiaridade com a Língua-ponte que o
inspira escrever que “(...) Não preciso repetir que foi a ponte que me trouxe
até aqui novamente. Não apenas a ponte sobre o rio, interligando as cidades, mas
a ponte entre os rios que somos nós. Há outras imagens sobre os rios... Nós
somos rios. Nós somos rios e sobre pontes percorrermos de um lado para outro de
nós mesmos. Que formidável sintonia com o pensamento Nietzscheneano I. Luiz
Andrade expressa em sua obra, já que este pensador alemão compara o homem a uma
ponte, que não é finitude, mas transição e queda e nisto reside a sua grandeza.
O livro “A ponte, apesar do rio” é leitura deliciosa e atual. Provoca reflexões
existenciais e nos leva a pensar sobre nós mesmos e mesmas e sobre os paradoxos
do nosso tempo. É ponte que, apesar do rio, este nascente e deságue, nos
transporta para o campo aberto de leituras possíveis. <br />
<br /> Boa leitura! <br />
<br /> Professora Dra. Marluce Freitas de Santana, UNEB <br />
<br /> <b>Livro disponível nas versões ebook e física. www.amazon.com.br, www.amazon.com e demais lojas</b>.
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-24017732119121659142019-10-22T12:57:00.002+01:002021-02-25T17:46:08.261+00:00Memórias: os perfumes que ficaram<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhUnY3RmHoRPU3g9EsI77JMBtbodAHc10-8dHSC6WLq30SAQ_SN-JM5qorU1DqHYhj91x8wnaaAuAFFmVSI8POEwIg-slXQv6NOdvjht-qUohpaN0b8zbsRumaaZ0N3HCeA1lUjlxq1beM/s1600/IMG_2928.jpg" imageanchor="1" ><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhUnY3RmHoRPU3g9EsI77JMBtbodAHc10-8dHSC6WLq30SAQ_SN-JM5qorU1DqHYhj91x8wnaaAuAFFmVSI8POEwIg-slXQv6NOdvjht-qUohpaN0b8zbsRumaaZ0N3HCeA1lUjlxq1beM/s400/IMG_2928.jpg" width="300" height="400" data-original-width="1200" data-original-height="1600" /></a><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgGxiWt6fWynZCUC1IA60SLCbQVcAP6Mzmv75dwKj_J8KkpiIRu8HCdG-YcP65EHARPgjR8G8sfJSssjqILTOL5B7Dcnv9ZlvFB9YiKAGMZwDzzB6jNddqOy3MpHNsiZDT6l8sEEQnI5uI/s1600/IMG_2931.jpg" imageanchor="1" ><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgGxiWt6fWynZCUC1IA60SLCbQVcAP6Mzmv75dwKj_J8KkpiIRu8HCdG-YcP65EHARPgjR8G8sfJSssjqILTOL5B7Dcnv9ZlvFB9YiKAGMZwDzzB6jNddqOy3MpHNsiZDT6l8sEEQnI5uI/s400/IMG_2931.jpg" width="300" height="400" data-original-width="1200" data-original-height="1600" /></a><br />
<br /> Esta é a história de uma avó que, desde a sua infância, enfrentou problemas como uma imposta separação dos pais por uma avó autoritária e que dominava praticamente o destino de toda a família. Foi ela quem administrou toda a infância e adolescência desta neta, até entregá-la a um casamento, cujo noivo foi ela mesma quem escolheu. A neta, sem qualquer direito de decisão, foi insinuada de prostituta, devido ao único envolvimento que teve com o noivo: um amedrontado aperto de mão. Durante toda a sua vida, freqüentou apenas um ano de escola. Empolgada para o recomeço das aulas do ano seguinte, o seu sonho foi desfeito quando a sua avó ficou sabendo que a sala de aula, até então formada por meninas, estaria matriculando, também, meninos. Mas, a sua força de vontade foi prevalecendo, e, empolgada pelas romances lidos por uma tia, foi ouvindo a obra de Machado de Assis, José de Alencar, Cervantes, entre outros, adquirindo, então, o conhecimento e o “gosto pela leitura”. <br />
<br /><i>"É uma recordação muito vaga a que eu tenho de minha mãe, mas eu me lembro daquela cena como se fosse hoje. Ao mesmo tempo que está perfeitinha em minha cabeça, como se eu estivesse vendo tudo, não consigo explicar direito e com muitos detalhes. Queria tanto me lembrar de mais coisas! O rosto dela, a gente conversando, as palavras que ela falava comigo... Nem sempre a gente consegue lembrar daquilo que a gente quer, pois chega um tempo que as lembranças são como uma ventania, um tumulto na cabeça da gente e muitas coisas ficam embaralhadas no meio das lembranças. Tem acontecimentos que nunca vão virar recordações com todos os detalhes e isso, às vezes, impede a nossa satisfação. Na verdade, eu era muito novinha pra lembrar com perfeição da minha mãe, e é certo eu dizer que essas lembranças fizeram muita falta, pois eu já precisei muito delas nas minhas recordações."<br />
<br /> (Fragmento do capítulo 2. "Memórias: os perfumes que ficaram")</i><br />
<br /> <b>Disponível nas versões ebook e física. www.amazon.com.br, www.amazon.com e demais lojas.</b> <br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-25749344407946774672016-11-28T19:43:00.002+00:002016-11-28T19:43:56.277+00:00Do livro "Fragmentos do Diário de Martha B.", <div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjOdb7gR3F73DdOg3HxKLrTw7InGFbhefMuSeSr8w7ApnRfDZifvf_mafguhEYHV25nhfzaWFIOoNuwCURQ7syKopQuQEQJ78jJ88xhnfuIxhGxb-6qnryToSuVB2QpcgaEZIWD9aMZTog/s1600/2016-03-10+15.03.13-1.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjOdb7gR3F73DdOg3HxKLrTw7InGFbhefMuSeSr8w7ApnRfDZifvf_mafguhEYHV25nhfzaWFIOoNuwCURQ7syKopQuQEQJ78jJ88xhnfuIxhGxb-6qnryToSuVB2QpcgaEZIWD9aMZTog/s320/2016-03-10+15.03.13-1.jpg" width="320" height="320" /></a></div><br />
1 de março<br />
Tantas coisas eu planejei dizer hoje a Simon e não disse! Eu, esta pessoa forte, destemida, cheia de impulsos, e eu mesma esta pessoa fragilizada, recolhida em um casulo, impotente. Eu tão desprendida e tão retraída, eu afoita, cheia de entregas, e eu mesma mergulhada numa profundidade de mim mesma. Eu lá fora, cheia de contentamentos e entusiasmos, e eu aqui dentro de mim, cheia de indagações perdidas na busca de questionamentos e respostas firmes. Eu assim, certamente uma cópia de muitas outras pessoas espalhadas por aí, caladas em seus quartos e a pensar e repensar os seus instantes mais íntimos, os sentidos das coisas, o sentido da dor, quando dor, e o sentido do prazer, quando prazer, o sentido da melancolia, quando melancolia, e o sentido da felicidade, quando felicidade. Coisas assim, o antagonismo das sensações e sentimentos envoltos na existência.<br />
Nada de mais significativo que eu planejei falar a Simon, eu falei. Os meus sonhos quando a noite na profundidade do meu sono, a minha decisão de que não mais escreverei a ele com a minha caligrafia deslizando sobre os papéis... Nada disto falei. Eu recuando dos meus conflitos, eu recuando de cobranças, eu recuando de expor a minha própria vontade, eu com receios de abrir mão de Simon, mesmo com alguma certeza de que já não o desejo tanto, eu sem mais certeza do que sinto por ele. <br />
O espírito e a carne. Que digo eu sobre uma relação tão íntima e tão oposta? Que digo eu do amor sublime? A felicidade a partir do amor, ainda que nem tão sublime, a minha carne, meu ventre, os meus seios sedentos... Tudo se distanciando de um elo que esteve seguro dentro de mim.<br />
Nada daquilo que mais planejei expor a Simon depois de sua chegada eu expus, e eu me sinto um pouco frustrada e entristecida em meio a essas inseguranças. Como pode uma mulher que se revela tão segura de si ser fragilizada por uma base tão líquida e oscilante em seus movimentos rumo a algum porto seguro? E onde é esse porto seguro? Uma pergunta que eu até poderia arriscar a fazer ao psicanalista, mas o que ele me diria a não ser, suponho, reenviar a pergunta a mim mesma? Confesso que já senti alguma vontade de estar lá, retornar àquela sala, àquele ambiente de expurgação, mas logo reluto e desisto. Acho que eu ainda não expressei essa minha oscilação aqui: o de retornar às sessões de análise. Não sei se, necessariamente, ao mesmo psicanalista, mas ao propósito. <br />
[...]. Não.<br />
<br />
<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-74765060509405414852016-07-11T01:58:00.003+01:002016-07-11T18:21:15.834+01:00E, porque queria...<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj43_dgH4vZ87L2XKwIH13m0zQYC_iMsMboWmo1rU3vyLEKAwnhza6w2UZs2iPrAQ-LAtLfumycs-7CqptbM0ScnQsK1Zv6ec8ZaQKSyWQHleKDDPiHKqiy9HHGbQiZcsIm-uSb4b3P_KY/s1600/2016-02-07+08.56.49.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj43_dgH4vZ87L2XKwIH13m0zQYC_iMsMboWmo1rU3vyLEKAwnhza6w2UZs2iPrAQ-LAtLfumycs-7CqptbM0ScnQsK1Zv6ec8ZaQKSyWQHleKDDPiHKqiy9HHGbQiZcsIm-uSb4b3P_KY/s400/2016-02-07+08.56.49.jpg" width="300" height="400" /></a></div><br />
E quando passei por lá como havia combinado, eu não me levei por inteiro como havia quase prometido. Fui, faltando alguma parte de mim e eu nem sabia qual era. Mas, desde quando apanhei a chave e bati a porta, eu percebi que alguma coisa não estava comigo naquele instante. <br />
Já na calçada, pensei em retornar e descobrir e procurar o que eu havia deixado para trás. Há coisas assim, das quais nem o nome sabemos, mas as conhecemos pela intuição ou pelo incômodo que apalpa o nosso peito de modo estranho. Pensei mesmo em retornar, mas não retornei. Prossegui, como eu eu havia quase prometido. Eu queria. E, porque queria muito, comecei a enganar a mim mesmo, induzindo-me a fingir acreditar que tudo seria como havíamos idealizado naquele instante de fantasias sentidas à flor da pele. <br />
Eu quase chegando, quase tocando a campanhia, a porta sendo aberta, o agradável perfume exalando suavemente pelo ambiente, e uma repentina náusea intuitiva expeliu daquele aroma e comprimiu o meu estômago antes que eu tocasse a campanhia. Ainda assim, respirei, pausadamente, fiz de conta que eu havia me desviado da náusea, levei minhas mãos até o botão, parei dois ou três segundo, quase estátua, e pronto. <br />
Agora, já não dava mais para deixar de adentrar. Inventei que não.<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-70864061033175395172016-05-15T18:21:00.000+01:002016-05-15T18:21:15.295+01:00"Quase Jardins" (Trecho do romance)<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgs4LkOQPat0YBA41BnJpumfKXnotGzqVuj_zW_YAldBOquD7jo7l6rghYmsUvXjRzNTkeJ0zgOaibnuubHKW0G0DDEyHNYYPbPW_nQGjx-kHVXuchjS7ud8X1oYba4eJmmi_Cjtyqmse0/s1600/IMG_3548%25281%2529.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgs4LkOQPat0YBA41BnJpumfKXnotGzqVuj_zW_YAldBOquD7jo7l6rghYmsUvXjRzNTkeJ0zgOaibnuubHKW0G0DDEyHNYYPbPW_nQGjx-kHVXuchjS7ud8X1oYba4eJmmi_Cjtyqmse0/s320/IMG_3548%25281%2529.JPG" /></a></div>[...].<br />
O bicho estranho que a avó dizia futucar o menino não se sabe se existia, se era mito, se era lenda, se loucura ou outra mentira da avó, Mentira, mentira, eu não tenho um bicho dentro de mim, eu não tenho um bicho, José afirmava e repetia para si mesmo, sozinho. O menino dentro do quarto imaginava um bicho de pernas longas, finas e enrijecidas, quase monstrinhos a andar dentro dele, um bicho de duas longas asas que voavam em seu corpo em busca de um pouso dissimulado e era corrosivo. Ele olhou para as paredes e viu um imenso inseto subindo, subindo até o alto, e fez a travessia no teto diante de seu olhar apreensivo. <br />
Ele viu. <br />
As pernas longas, finas e enrijecidas, e que cresceriam muito até ficarem deste tamanho assim.<br />
O bicho parou bem no canto da parede. <br />
Por um momento, José ficou com o olhar para o alto, alheio às palavras da avó que se alternava entre suposta brandura e intolerância. As mãos na cintura, ela imponente, e tudo se tornou tanto, de modo que ele desejou ficar ali dentro para sempre. Até o fim do mundo. Foi a sua avó. Até fim de mundo ela já havia narrado para José nas poucas vezes que inventou contar histórias, A vovó vai contar uma história muito bonita. “Era uma vez…”, ela começava assim, e logo tomava outros destinos, quase todos em direção a qualquer lugar que fosse um caos, O castelo era muito, muito, muito lindo e depois caiu um raio e destruiu tudo, tudo, tudo acabou, o quarto, os brinquedos, a casa, tudo, tudo, o quarto, os brinquedos e a casa que eram de José. O apocalipse infantil. Ele ficava com os olhos assustados diante das narrativas da avó, os olhos desconfiados, até que, anos depois, o olhar do homem era o lamento da criança.<br />
O inseto permanecia lá no alto, entre o teto e a parede, e do outro lado da porta a avó fez o seu pronunciamento com uma voz que lhe fez lembrar qualquer imagem assustadora de seus desenhos animados. A voz, surpreendente naquele instante, atravessou o buraco da fechadura, dócil, ele desconfiado, e a voz novamente dócil.<br />
- Desça da cadeira, José! Desça da cadeira que a vovó vai empurrar a porta, e, se você não descer, você vai cair.<br />
Ajoelhado, José pensou um pouco e sentou-se na cadeira, decidido a descer depois do que já havia imaginado. Perplexo, viu que o inseto estava descendo pela parede e as suas asas pareciam maiores do que antes. O inseto descia, e, enquanto se aproximava, José observava que as suas asas se avolumavam imponentes, prontas para um voo inexprimível em direção a qualquer lugar longe daquele. Entretanto, quando já chegava ao fim, a avó fez um novo pronunciamento e ele questionou se aquele inseto era igual ao bicho que ela disse existir dentro dele.<br />
O inseto voou. Mas o menino não. <br />
Ele voa, e eu não. Isso o menino não conseguia entender, as asas e o voo. O inseto voou. Ele ficou ali, parado. E a avó do outro lado, como se estivesse ali dentro.<br />
O inseto voou e passou bem perto de sua cabeça no exato momento em que aconteceu aquilo que para ele foi um grande estrondo, mais do que um grande estrondo, O fim do mundo vai ser cheio de estrondos, muitos, muitos estrondos, não vai sobrar nada, nada. Final de uma das histórias de sua avó. Ele, assustado, soltou um grito por causa do inseto quase dentro de sua boca, quase pousando dentro dele: e o estrondo na porta como sinal do apocalipse prenunciado e espalhado em suas lembranças. Para José, aquela foi uma explosão muito maior do que havia sido, o inseto bem maior do que realmente era, a realidade confundida com a fantasia já quase sem lugar algum.<br />
[...].<br />
<br />
(In: Quase Jardins (2016), Editora Apenas, disponível em www.amazon.com<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-36794061396894635092016-03-01T01:37:00.001+00:002016-03-06T21:03:11.502+00:00Enquanto o café chegava...<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxdE_L-i7S8dKU2i0NfNynoZOfq91WIaczIZ-GTuY5bJeKyKC6vHZuL3Y70TLvx2Hj1HXAu_Wyg4xz_w2vSWRlj_n2UCz97CNx14eZeoC7W6DrW95J2nrKsTxyAQEgr1336HpeHEIlBbw/s1600/IMG_4156.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjxdE_L-i7S8dKU2i0NfNynoZOfq91WIaczIZ-GTuY5bJeKyKC6vHZuL3Y70TLvx2Hj1HXAu_Wyg4xz_w2vSWRlj_n2UCz97CNx14eZeoC7W6DrW95J2nrKsTxyAQEgr1336HpeHEIlBbw/s320/IMG_4156.JPG" /></a></div><br />
Não disse mais nada e foi em direção ao saguão do aeroporto, diretamente para o Café mais próximo. Com a sua natural inquietação em dias assim, pediu um café e começou a observar a atendente, que dividia a sua atenção com um sorriso e uma conversa entre os dentes com a outra atendente, como se o seu café fosse a coisa menos importante para ela e para o estabelecimento. Era exatamente essa a sua conclusão. A falta de atenção no serviço ou seja lá em que sentido for sempre lhe fora motivo de indignação. <br />
<br />
Sentiu vontade de sair dali e, ironicamente, agradecer o café que parecia nunca chegar. Mas não. Ele esperaria que a moça cheia de sorriso e conversas disfarçada entre os dente chegasse com o café e, então, ele lhe diria tudo o que estava sentindo por causa daquele descaso, isso sem nem mencionar a sua ansiedade ofegante, prestes a explodir dentro dele, afobado pelo sabor do café para ele viciante e que, mesmo que nem sempre, o ajudava a acalmar a sua ansiedade. <br />
<br />
Enquanto a atendente aguardava aquele curto café cair de vez dentro da pequena xícara, ele empurrava para dentro do seu estômado tudo o que ele planejava expressar naquele momento em alto e bom som. Assim que a atendente colocasse o café sobre o balcão, ele planejou, desabafaria com ela sem nem se importar se todos o achariam ridículo e, logo em seguida, exigiria a presença do gerente. <br />
<br />
E foi assim que, na sequência dos seus pensamentos, ele ficou ainda mais perplexo e indignado com o desenrolar daquele instante... Olhou bem firme para a atendente, os lábios trêmulos de nervoso, a fumaça do café já quase desaparecida, o aroma que lhe acalmava desaparecia no ar, e ele sem acreditar que, em num mesmo dia, mais um incômodo embaralhava a sua paciência.<br />
<br />
“Como assim, a gerente não está?”. Ele perguntaria, ao que ela, a atendente, cheia de “sorrizinhos irônicos entre os dentes responderia: “Não senhor, ela não está mesmo. Foi ao almoço e costuma demorar um pouco”. Ela respondeu, com uma ironia mal disfarçada e acrescentou: “Felizmente!”. Ele ouviu muito bem, e então decidiu tomar o café, sem dizer uma palavra sequer, interrompendo as suas elucubrações antes que o dia se tornasse ainda mais incômodo. <br />
<br />
A atendente, por sua vez, começou a preparar outro café, o cliente seguinte, mais uma história desconhecida das dezenas e centenas que passava por ali, todos os dias. Ela, pacientemente, tão próxima e tão distante de cada um deles, sem nem mais sentir direito o aroma e o sabor daquele que lhe fora imposto propagar ser o melhor café de toda a cidade.<br />
<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-67161821136199571112015-12-30T16:21:00.000+00:002017-06-14T14:22:27.023+01:00Quase véspera de aniversário<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgKORfvkIcyOwdthfpBKXqmQSCpzAqpjadJzCTrwNoLZRdpry3D3pn0NEPUCEUxZxvmXbSd1gQ-Tqx1Js_qkAW7al3MwpKHkNg7GqUFKxaE6bLekRbo2yf3Zz54ysna1L2dhzUJsgpVchQ/s1600/2015-09-22+18.05.34.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgKORfvkIcyOwdthfpBKXqmQSCpzAqpjadJzCTrwNoLZRdpry3D3pn0NEPUCEUxZxvmXbSd1gQ-Tqx1Js_qkAW7al3MwpKHkNg7GqUFKxaE6bLekRbo2yf3Zz54ysna1L2dhzUJsgpVchQ/s400/2015-09-22+18.05.34.jpg" /></a></div><br />
Era quase véspera do seu aniversário e ela estava a percorrer as ruas da pequena e elegante cidade em busca de um lugar. Ela desejava um lugar onde todos coubessem confortavelmente lá dentro. As taças de vinho sobre as mesas e nas mãos de cada um dos convidados, o vinho sendo movimentado como suaves ondas dentro das taças. Algumas, ainda cheias, e outras quase vazias. Ali ao redor, algumas garrafas imponentemente eram expostas à espera de alguém. De repente, ela interrompeu o pensamento e o sorriso para a mesa inteira. Criteriosamente, ela havia procurado um lugar para a sua festa, e alguém. Alguém aguardado pelas garrafas de vinho, e que já estava ali, quase todos, e alguém que ainda não havia chegado, ou que ainda chegaria. <br />
<br />
E o que não chegaria. <br />
<br />
Não naquele seu aniversário, não naquela comemoração, não naquela felicidade. Mas outro dia, quando outras taças, quando outro vinho, outra comemoração. “Sempre haverá de existir outro dia para qualquer que seja a felicidade”, ela pensou, em uma mistura de sentimentos que oscilava entre o prazer de estar ali entre encontros e ausência. <br />
<br />
Nem todos chegam no mesmo dia, nem todos chegam na mesma hora, nem todos chegam para a mesma festa. Ela estava segura disso. Então, sem disfarce algum, pegou a sua taça e, enfim, brindou aquele dia. Ela queria estar radiante, mesmo sem outras certezas que ela queria. <br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-33897115720064469702015-11-30T16:31:00.002+00:002015-11-30T16:31:39.931+00:00A bola azul no mar<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7jqDePaO58N-_vizyThbokWcxBh8m5sJ5aY1X7mAtMipzG5k4J9he3kN8ATOWWWovFQKlkah_k97JDd0QeRIMDsrmaGyR9ZW2CIfKYC2feYQUmxnTuKXH5mEuUwPUQ_zZSNRrvpWrZjs/s1600/IMG_7382.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh7jqDePaO58N-_vizyThbokWcxBh8m5sJ5aY1X7mAtMipzG5k4J9he3kN8ATOWWWovFQKlkah_k97JDd0QeRIMDsrmaGyR9ZW2CIfKYC2feYQUmxnTuKXH5mEuUwPUQ_zZSNRrvpWrZjs/s400/IMG_7382.JPG" /></a></div>Era um dia de muito azul no céu:<br />
O menino pegou a bola azul e jogou dentro do mar<br />
A água trêmula do mar azul levava a bola pra cá e pra cá<br />
Pousando a bola nas margens que não era de cor azul.<br />
Tão azul era a bola, e azul era também o mar.<br />
Não. <br />
Não era azul o mar, era a água do mar<br />
A bola azul do menino balançava pra lá e pra cá<br />
Na água azul do mar. <br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-80600117132646940752015-10-24T10:17:00.002+01:002015-10-24T10:17:46.374+01:00Um sutil sorriso do silêncio<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTa08G8I2pJKFatJeLuCLtReYMWqLWUp_I4RfhduWmsSVwxh7ZI4vnWmbunISO-nxjR8QD6xxvnx8-8XJmyXo_Maif_TVlDTmF1usDdJyMkJI4LfMhfi-VxkD9_XTjf0DjGe95SKP_W0M/s1600/2013-01-20+13.28.27.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgTa08G8I2pJKFatJeLuCLtReYMWqLWUp_I4RfhduWmsSVwxh7ZI4vnWmbunISO-nxjR8QD6xxvnx8-8XJmyXo_Maif_TVlDTmF1usDdJyMkJI4LfMhfi-VxkD9_XTjf0DjGe95SKP_W0M/s400/2013-01-20+13.28.27.jpg" /></a></div>O silêncio amanheceu com um sutil sorriso num dos cantos da boca, meio sorriso e meio silêncio. Percorreu a sala, olhou pela janela e viu o vento, contemplou a luminosidade opaca do nublado da paisagem, abriu a janela, sentiu o cheiro do tempo, cheiro de tempo com o cheiro que subia da terra molhada, a chuva que cessara, o vendaval que cessara, o coração bem mais desacelerado que no dia anterior, quando o ventania, o temporal, as horas incessantes... O coração agora batendo brando, as horas passando brandas, um vento brando tocando em seu rosto... E contemplou no fio da eletricidade um pássaro que acabara de pousar. (Parecia-lhe também tão reflexivo!).I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-31890228392763201822015-08-31T14:15:00.001+01:002015-08-31T14:42:15.459+01:00Clandestinas intuições<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjgvdUmZ_q0wfDpO2o7jG79C_xthVMaZKrERRt353M1XjR9COn0QScdEnGZ7Zmy_Pwh_jlpSkvx-w9kU_ZWOVWicQ2R_WjfJv2D8haD1bNBQr-wJHTLlWXSkljuhVbE-y-dgOTxNbNH7oU/s1600/2015-04-09+18.57.50.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjgvdUmZ_q0wfDpO2o7jG79C_xthVMaZKrERRt353M1XjR9COn0QScdEnGZ7Zmy_Pwh_jlpSkvx-w9kU_ZWOVWicQ2R_WjfJv2D8haD1bNBQr-wJHTLlWXSkljuhVbE-y-dgOTxNbNH7oU/s400/2015-04-09+18.57.50.jpg" /></a></div><br />
Depois de viver as mais diversas variações das suas histórias, depois de novamente acreditar que entre eles tudo já havia sido resolvido e que agora viveriam em paz para sempre, depois de desistir e acreditar que não havia mais jeito além da separação definitiva, depois do vai-e-vem só lhe restou uma alternativa, já que as anteriores nunca deram certo: virou-se pra ele e disse que um dos dois terminaria louco naquela história. Ele se tornaria louco ou a enlouqueceria. <br />
<br />
Passou então a viver na perspectiva de observar quem se entregaria de vez à loucura, “justo numa época em que asilo para doentes mentais entra em plena extinção e devem ser acolhidos pelos esperados afetos familiares.” Em meio aos seus acessos de crises, ela olhava bem pra ele e se lembrava de tantas personagens excêntricas, reais e irreais, quase reais das telenovelas. Olhava para ela mesma, quase lhe suplicando para não ser enlouquecida, e insistia na idéia de que entregar-se à arte poderia lhe fazer um bem imensurável. Quem sabe, seria uma excelente escultora e construiria em cera ou em bronze o coração perfeito para os seus anseios, assim pensava. Ela não desgrudava, da cabeceira da sua cama, aquele livro de esculturas que atraiam o seu olhar a tantas divagações. “A Suplicante” e “O Abandono”, imagens a alimentar as distorções dos seus sentimentos e que lhe expressavam algo que ela nunca conseguia explicar.<br />
<br />
Eles se amavam. Amavam-se muito. Era uma história de um amor tão grande que vale a pena um dia parar pra contar. Uma mistura do mito de Tristão com o mito de Don Juan. No entanto, ela já não mais sabia se valia a pena pagar por um amor o preço de uma loucura. Ele não suportou quando em um só ano ela resolveu fazer tantas mudanças em sua vida, e ele se afundava no trabalho para esquecer tudo o que, meticulosamente, imaginava como razões destas mudanças. Ela também trabalhava muito, e ele não conseguiu disfarçar que achava uma ameaça as tantas vezes que ela falava do alto cargo que a sua colega de trabalho havia alcançado. Tinha certeza de que aquilo era uma espécie de aviso para ele, alertando-lhe de que ela também chegaria lá, custasse o que custasse, e que ele, com aquela visão de que não se precisa tanto para viver, não sairia daquele “desgraçado curso supletivo”. <br />
<br />
A mudança que ela fez em um só ano foi realmente demais para a sua cabeça. Começou a pagar as prestações de um carro novo, e inventou fazer vestibular pra Direito, e ele, para não ouvir mais uma vez que era um desmancha prazer e invejoso, por nunca conseguir passar na prova do supletivo de matemática, química e física, engoliu em seco aquela sua decisão e sofreu mais uma insônia terrível naquela noite. Ela pulou de contentamento, ligou para aquela sua colega que havia subido de cargo e pra tantas pessoas mais, quando dias depois viu o seu nome na lista dos aprovados. Ele a abraçava entre um sorriso e uma mágoa de derrota travada no peito. Com a mente rica de insinuações, enquanto parabenizava-lhe, dizia, para o seu próprio coração, que estava perdendo a sua mulher. Entregava-se a imaginações diversas, e depois vivia a angústia provocada pelas cruéis imagens das suas clandestinas intuições. Mas ela ainda o amava muito, e ainda seria até capaz de parar pra pensar se valeria a pena deixá-lo por um curso de direito. Enquanto isto, a fertilidade da mente dele já a tornara numa advogada ousada, numa juíza cheia de poder, mulher liberada, deliberada, audiências e mais audiências, e ele naquele maldito supletivo com as provas de matemática, química e física por fazer. <br />
<br />
No primeiro dia de aula... Meu Deus! No primeiro dia de aula!... No primeiro dia de aula, ele fez questão de chegar mais cedo em casa. Ela estava tomando banho, e ele ficou ali sentado na cama, observando todas as suas atitudes até ela sair de casa. Um caderno novinho, um caríssimo livro sobre leis, comprado precipitadamente, lápis, borracha, caneta, e o rastro do seu perfume que ficou cravado em seu ciúme. Ela estava vestida como nos demais dias se vestiria para alguma ocasião daquele tipo, mas, para ele, no escondido dos seus medos, ela nunca estivera tão bonita e perfumada. Começou a pensar nos colegas e professores que ela teria, e passou a desconfiar de cada um deles. Apesar disto, ele muito se esforçou para não manifestar essas reações, receio de ser visto como criança boba, ciumenta, encrenqueira, como desde criança lhe acusavam. Meses de noites torturantes para ele, ainda mais por ter que dar mais atenção às crianças, resolver problemas pendentes, papéis, pagamentos, obrigações que ela sempre cumpria da melhor maneira possível. <br />
<br />
Um semestre inteiro se passou, e ele nada disse, embora torcesse para que ela se percebesse incompetente, fosse reprovada em todas as disciplinas do curso, e voltasse a ter a feijoada do fim de semana como a melhor diversão da família. Ela realmente teve dificuldades nas aulas e notas insatisfatórias, porém, uma força que parecia escondida num lugar que só ela sabia, se manifestava dia após dia, e as suas notas se superavam uma após a outra. Ele aguardava cada resultado, ansiosamente. Um, dois, três, quatro. Cinco. No máximo. Eram as notas que ele desejava para os seus resultados. E estava cada vez mais difícil esconder as suas frustrações, ciúmes, mal humor, desculpas de horas extras para não mais ter que dar tanta atenção às crianças. <br />
<br />
Entretanto, ele nunca demonstrou tanto rubor em seu rosto como no dia que ela anunciou mais uma mudança naquele ano. Uma mudança que, de certa forma, também resolveria uma das suas maiores queixas: peito flácido, peito pequeno, peito isto, peito aquilo. É verdade que ele tratava desse assunto com o maior cuidado para não magoá-la, mas, no dia em que virou para ele e “marquei minha plástica para uma semana após o inicio das minhas férias da faculdade”, ele, numa cara de completo espanto, virou-se pra ela e: “Plástica?” Imediatamente visualizou aqueles seios fartos se esfregando nos rostos dos colegas, professores e chefes. Ela anunciou os trezentos e cinquenta miligramas de silicone que estaria usando, o que foi uma espécie de morte para ele, que nada pôde dizer, se tantas vezes reclamou dos seios que ele apalpava. Para ela, aquele rubor em seu rosto era sinal de que ele estava imensamente contente, porém, em seu intimo, ele não mais a desejava atraente, e remoía “por que justo agora?!”. Para ele, aqueles novos seios eram culpa dos colegas e dos professores da faculdade, que ainda se sentiriam atraídos, seduzidos, convidados pelo belo par de peitos que contornaria ainda mais aqueles olhos bem azuis. <br />
<br />
O semestre acabou. Ela foi aprovada em todas as disciplinas, foi eleita líder da turma, passou quase uma semana das férias, dando total atenção a ele e aos filhos. Depois colocou o necessário em uma maleta, perfumou-se, e foi fazer o seu implante. Naquele dia, ele não aguentou e muito chorou, trancado em seu quarto vazio. Dias depois, após a quinta tentativa, apesar de ter sido com nota mínima, ele conseguiu ser aprovado na prova de matemática, e nem deu a noticia a ela. <br />
<br />
A cirurgia ficou impecável. Os seios, perfeitos. Ele queria odiá-la intensamente, mas a desejava cada vez mais. Quase não suportou o início do novo semestre escolar! Tomado por uma consternação maior, desejou gritar para que ela não usasse aquela blusa tão decotada, não usasse aquele perfume que havia marcado o primeiro encontro deles, não penteasse os cabelos daquela maneira que ele tanto gostava, e nem usasse maquiagem, justificando que a sua maior beleza era a natural. O perfume que ela deixava pela casa torturava os seus pensamentos, aumentando a sensação de que ela já o abandonava, e abandonava os filhos, e abandonava a casa, e não gostava mais de feijoada. Até em pato ao molho de vinho e ervas ela já falava, e isto o deixava intrigado.<br />
<br />
No decorrer desse novo semestre, ela já falava em Ricardo, Pedro Antônio, Xândre e outros colegas. Rotineiros trabalhos em equipe, reuniões aos sábados, apresentações de seminários, e as feijoadas do sábado eram cada vez mais canceladas. Ela, contente pela perspectiva de proporcionar uma vida melhor à família; ele, se sentindo traído, e aqueles seios que não o libertava do sentimento de não mais serem apenas seus. Seu rosto se entristecia cada vez mais, a sua mente lhe torturava quase sem medida. Dominado por estes impulsos, ele passou a segui-la até a faculdade, a observar as suas saídas, a controlar o horário dos seus retornos, e ficava revoltado por não confirmar as suas conclusões tão convictas.<br />
<br />
“Ou eu ou a faculdade”, foi a sua primeira manifestação verbal, justo no dia em que ela havia retornado pra casa com tantos elogios. Foi tudo de uma forma brusca e inesperada. Ela nada entendeu, e ele foi “tirando dos cachorros” e jogando nela. De repente, sentiu a juíza se quebrar em mil pedaços, suas promoções sendo canceladas, as agradáveis reuniões em equipe sendo suspensas, e nunca mais poderia ver Xândre, o mais divertido da turma. “Ou eu ou a faculdade”, ele repetiu, pausadamente, diante do seu silêncio perplexo. Ela até pensou que ele estivesse brincando, mas pensou também que ele estivesse ficando louco igual ao primo da mãe dele, louco depois de atormentado por criativas obsessões. Ele falava tudo o que havia guardado durante meses. As suas veias se excitavam na altura do pescoço, uma espuma grossa se avolumava pelos cantos da sua boca, e ele, alheio aos olhos apavorados dos filhos, desabafava todas as suas conclusões: que ela se insinuava para todos, que era oferecida, que estava lhe traindo, que seria corroída pela sua própria ambição, e outras coisas que ela ficou com vergonha de contar. Ela, estática, segurando firme a sacola com os novos livros que acabara de comprar. <br />
<br />
A sua vida estava um inferno, ela disse. Não conseguiu nem chorar, tomada por um forte estado de choque. E ele a chamava de cínica, e dizia que aquele seu silencio era a própria confirmação de tudo. Ainda assim, ela permaneceu calada até que ele chorou desesperadamente um choro de criança. Sentou-se no chão, apoiou os seus braços no sofá, apoiou a cabeça sobre eles, e começou a soluçar. Ela pediu que as crianças fossem para o quarto, aproximou-se dele, tocou em sua cabeça, pensou nas várias histórias que ele havia contado da sua infância, beijou os seus cabelos e lhe disse baixinho que nada daquilo era verdade, que ele era o amor da sua vida, e deu-lhe uma grande noticia: no dia seguinte, trancaria o semestre na faculdade. Ele, então, ficou muito envergonhado pelo vexame que acreditava ter dado. Ela pegou em seus braços e ajudou a levantar aquele homem de corpo forte, robusto e tão mais frágil do que ela. <br />
<br />
Na cama, ele pediu perdão por tudo. Dizia que ela era a mulher da sua vida, que não a deixaria por nada, que confiava nela, e que concluísse o seu curso na faculdade. Aproveitou e disse que havia sido aprovado na prova de matemática e que assim que passasse nas de química e física faria vestibular para engenharia. Empolgou-se dizendo que juntariam muito dinheiro e passariam uma lua de mel nas Ilhas Gregas, onde Xândre havia passado as suas últimas férias. Ele beijou muito o seu corpo naquela noite, ocultou a tormenta de ciúmes ao tocar em seus seios, e os tocava da maneira que ele imaginava que só ele sabia tocá-los.<br />
<br />
No dia seguinte, ele estava novamente muito sério. Sem olhar em seus olhos, disse que realmente seria melhor interromper o seu curso na faculdade. Mas, para a sua surpresa, ela foi incisiva e não mais concordou em abrir mão de um futuro que lhe atraia. Ele voltou a insultá-la e, daí pra frente, a vida foi se tornando cada vez mais em altos e baixos. Num dia ele a amava, noutro dia dizia odiá-la; num dia, ela acreditava que ele estava enlouquecido; noutro dia, achava que era tudo por amá-la demais. Nestas variações, ela decidiu que realmente seria juíza, e que, apesar do seu amor, a porta estava aberta para ele escolher o seu próprio destino. Foi quando ele passou a se rastejar aos seus pés, alternando esta atitude com ameaças de divórcio e xingamentos sem fim. <br />
<br />
Foram quase quatro anos nesta desavença. Fantasmas corroendo aquela alma, ela muito abatida, mas com propósito de não se desanimar com a vida. Perderam-se muito em meio às suas variações emocionais: malas diversas vezes arrumadas e desarrumadas, quartos separados por vários dias, e os seus retornos perdendo o sentido. Um não mais sabia quem era o outro, ou quem eram eles mesmos.<br />
<br />
Exatamente hoje foi o dia da sua formatura. Ela sentiu a sua falta, e a última noticia sobre ele foi que, recentemente, havia sido aprovado na prova de física. Embora sentisse a perda daquele amor, nunca deixou de se encontrar com Xândre, o mais divertido da turma. E, para comemorar a formatura dos dois, foram jantar pato ao molho de vinho e ervas. Apenas os dois.<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-64604373028874258492015-08-10T11:52:00.001+01:002015-08-10T11:52:39.579+01:00Mas que jogo?<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj-uLEqUJE0ObE7eQl0nHY2JDOUJ7x64eW6PV1ReiPbdQrTke2-6hyXEuaqTtXJcDGmHUd64RtJnubWUZ4ob3RGh-scU8DGHHqwfmulAixbVY_LKu9EUDCJV7EVa38IRVKmkGS6RrIzQYc/s1600/6113.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEj-uLEqUJE0ObE7eQl0nHY2JDOUJ7x64eW6PV1ReiPbdQrTke2-6hyXEuaqTtXJcDGmHUd64RtJnubWUZ4ob3RGh-scU8DGHHqwfmulAixbVY_LKu9EUDCJV7EVa38IRVKmkGS6RrIzQYc/s400/6113.jpg" /></a></div><br />
“Eu não estou entendendo nada do que você está falando.” Respondeu à insinuação sem saber exatamente em que direção manter o olhar. Mas estava entendendo sim. Surpreso. Muito surpreso. Mas estava entendendo sim. Dizia isto apenas para tentar disfarçar o seu impacto ao ouvir o que estava ouvindo. Não era possível não ter sido tão secreto o seu esconderijo! Assim pensava, quase sem tempo para descobrir onde havia falhado. “Não está entendendo?” E ela repetiu tudo novamente, em entrelinhas, da maneira mais clara e dolorida repetiu, sem qualquer intenção de perversidade, mas com o propósito de esclarecer que o jogo havia acabado. “Mas que jogo?” Ele perguntou, ainda sem acreditar. A sensação de uma forte, muito forte pancada em sua cabeça, e de tudo, absolutamente tudo ser levado em meio a uma correnteza forte, em um rio sem rumo. “Mas de que jogo você está falando?” Tentou um desafio. “Quer que eu diga palavra por palavra de que jogo eu estou falando?” Ela retrucou, cautelosamente, no mesmo compasso em que, sentada sobre aquela excêntrica poltrona alaranjada, ela passava a folha seguinte, daquela outra saga, a qual ela estava lendo. A cabeça se movia quase imperceptível, enquanto os olhos se alternavam entre o livro e os intensos olhares sobre ele, que permanecia quase imóvel diante dela.<br />
Ele não respondeu se seria necessário que tudo fosse dito ou repetido palavra por palavra. Então, ouviu a mesma pergunta, de forma ainda mais compassada, dilacerante. “Vou a cozinha pegar água.” Foi a sua resposta. Atrapalhando-se sobre o tapete, saiu em direção à cozinha. As pernas trêmulas, visivelmente. Ela o acompanhou com o olhar e percebeu o seu nervosismo que, de certa maneira, lhe dava prazer. Intimidá-lo amenizava a sua dor. Parou o olhar sobre o nada e respirou uma dor em alguns cinco segundos. <br />
Na cozinha, algo se espatifou no chão. Ela levantou o olhar, mas, não ouvindo qualquer outro ruído naquela direção, insinuou retomar a leitura.<br />
Ele parado na cozinha, tenso. O copo aos pedaços espalhados pelo chão molhado. Olhou aqueles cacos com um olhar apavorado, e não enxergou nada, além dos seus próprios pensamentos atormentados: “E agora?”<br />
Ela na sala. O olhar congelado sobre as letras embranquecidas. Decidida. FimI. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-78866167188674574102015-06-20T23:49:00.003+01:002015-06-20T23:50:16.748+01:00À meia-luz<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiM-J89FjGwTDdHfmMW4PiVFv95qYB213aJALU3x6WulsJL8AMNEFU0JFIKS57uQSnsCx3RucQneQooHUHM9s3dJR52lbf3ScUiiDz099O4HnNaMvntKYDvvQbg2RAfpSXo1nZXdOyQIa0/s1600/FullSizeRender.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiM-J89FjGwTDdHfmMW4PiVFv95qYB213aJALU3x6WulsJL8AMNEFU0JFIKS57uQSnsCx3RucQneQooHUHM9s3dJR52lbf3ScUiiDz099O4HnNaMvntKYDvvQbg2RAfpSXo1nZXdOyQIa0/s400/FullSizeRender.jpg" /></a></div><br />
Em meio àquela busca do exato poema de Adélia Prado, desejado para aquele instante, inevitavelmente único, a taça de vinho tinto se descontrolou de sua mão, impulsionado por tantas imagens e palavras de significados múltipos. Um impacto. Sensações interrompidas, e se renovando. <br />
<br />
O vinho se espalhou repentinamente sobre o sofá branco. Marcas incisivas de desejos se misturando ao poema perdido, guardado entre tantas páginas, e revelando sentimentos intraduzíveis. Aquela mancha quase sutilmente constrangedora, mas era uma mancha de vinho entrelaçado em desejos contundentes, encorpado, enquanto o som do último poema ainda suplicava: “me dá a mão, me cura de ser grande.” <br />
<br />
A noite em meia-luz, e a capa de tecido que revestia a poltrona vermelha foi retirada, gentilmente, como se nada tivesse se estragado. O vinho já dilatando o desejo, instante de um afã quase suplicando os momentos seguintes: o que seria, o que poderia e precisava acontecer para transformar a noite em mais um poema que cura um menino de ser um homem grande.<br />
<br />
A estante cheia de livros, outros poemas, a música, as letras pausando cada instante, tudo se fazendo prazer, tudo meio explicado, apenas meio explicado. Nada precisaria ser tão explicado. Não ali, enquanto tantas coisas marcavam... Tantas coisas marcavam... Coisas? Mas o que são coisas? Questionavam poucos dias atrás, em busca daquelas explicações que ficam misteriosamente perdidas entre os olhares secretos, entre os segredos discretos, entre as palavras não-ditas, até que perceberam que nada daquilo se fazia necessário, se a cumplicidade era mesmo silenciosa. E intensa. Falaram algo a respeito de Kant, e fizeram uma breve pausa. Coisas, tantas coisas desde dias atrás.<br />
<br />
A última gota de vinho foi derramada, exatamente no centro da taça, imagina-se. E, determinantemente, anunciava com uma voz velada, bem velada e sussurrante, que logo as taças estariam vazias. <br />
<br />
As taças quase vazias.<br />
<br />
As taças vazias. <br />
<br />
Em suas mãos, um calor daquelas mãos aquecidas, paradas sobre a sua pele. Os olhares que deixaram de ser apenas desconfiados, o quarto bem ali, bem próximo, e o colchão coberto com uma bonita colcha colorida.<br />
<br />
A meia-luz agora quase escurecida. A colcha, colorida e tão bonita, amassada pelos cantos da cama. E, finalmente, o prazer em ouvir aquele poema lindo, sem nem mais saber se ainda desejava ser curado de ser grande.<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-39577756484266697482015-05-20T18:49:00.001+01:002015-05-20T18:49:23.082+01:00Quase interlocuções<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh1cIvcCBDUvN8Ul0iUnCr7N9IehhJRwxqzJBD5IqYVurCuD7sfllim5nT0j926B7u89tD5gqLAA4aDIU2IZr_cyTZF8Dvii-QTL8pmsmtkMwU2r0J_U-5qAP8KhYHeD8z5z04QZ8NsoEA/s1600/2012-09-25+08.00.30.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEh1cIvcCBDUvN8Ul0iUnCr7N9IehhJRwxqzJBD5IqYVurCuD7sfllim5nT0j926B7u89tD5gqLAA4aDIU2IZr_cyTZF8Dvii-QTL8pmsmtkMwU2r0J_U-5qAP8KhYHeD8z5z04QZ8NsoEA/s400/2012-09-25+08.00.30.jpg" /></a></div><br />
"Nunca contei nada de importante a quase ninguém. Fui me fazendo sozinho, obstinado, secreto." "Grite, repeti-me inutilmente com um suspiro de profunda quietude"... "... fechei-me na casa de banho para não me ver chorar." Louco. Uma loucura impenetrável pela lucidez tardia... "... acendo-me e me apago, acendo e apago, acendo e apago...” Lispector. Lobo Antunes... Versus (in)versus, o primeiro que escrevi. Algumas coisas infantis. Reli Lobo Antunes hoje... Ele é mesmo fantástico.<br />
<br />
A vida muda. Mudanças e emudecimentos. Imagino o dia de amanhã como o primeiro de muitos bons dias... Ainda bem que temos tantas outras fases depois das que não desejamos! Reflexões depois de algumas leituras interessantes: a vida pode nos surpreender com um amor que nem imaginávamos existir. Bobeira pensar que já vivemos o maior amor, pois, muitas vezes, ele ainda está por vir, até o dia em que chegar. Não sei se é possível explicar essas coisas.<br />
<br />
Amores redescobertos. Hoje, novamente, pensei muito no filme As Horas. Laura. Clarissa. Clarice. Vaughn. Lispector. Virgínia. Cenas incessantes.<br />
<br />
Fui dormir feliz ontem! Eu precisava ouvir tudo aquilo que ouvi... Eu precisava dizer tudo aquilo que disse... Muita coisa para ser discutida... Somos às vezes tão bobos! Um pouco da ingenuidade que não se vai para sempre... Amanhã às 13:30 vou trabalhar no lugar de M. Preciso pensar no que melhor fazer, pois foi uma emergência e fui avisado hoje. Hoje não estou conseguindo me lembrar de muitas coisas. Limitado estou às boas palavras que ontem ouvi, disse e senti ao telefone, e das coisas tantas que ficaram em meu coração. Alguém vai mudar de estado e cidade. Alguém, certamente! Distância pode tornar-se quase nada, você sabe disto. E eu também sei. O prazer da relação deve triturar a distancia. Alguém precisa mudar de cidade. Morros, serras, mirantes... É lá, ali, aqui onde está o duradouro ou o efêmero de cada um! <br />
<br />
Já comi tanto doce hoje! Chocolates desde ontem... E pastel de goiabada.... Rssssss.... <br />
<br />
Preciso terminar de escrever o artigo. Memórias! Preciso concluí-lo, mas vou parar de repente, sem a preocupação de ter concluído ou não. Às vezes, escrever é assim, parece que nunca está pronto. Essa coisa cheia de prazer e às vezes neurótica. Ler, ler, escrever, escrever, corrigir, corrigir. Façamos de conta que concluímos ou não. <br />
<br />
Meu Deus... realmente basta termos paciência e muitas coisas podem melhorar, curar, sarar! Acontecer. Tantos pensamentos juntos! É assim, às vezes. Algumas vezes conheci a dor dilacerante, e não posso ter dúvida que um dia um alívio chega. E essa vida correndo e pulsando dentro e fora da gente... Mesmo angustiado, temos que ter visão, e ter coragem. E paramos, e morremos um pouco, mas buscamos forças e prosseguimos, e fazemos o maior esforço para limpar os joelhos, e encontramos a vida sempre, novamente. E, como doem os joelhos! As marcas, as dores, mas, um dia, apenas cicatrizes, cicatrizadas, quase totalmente curadas. Quase, pois a memória tem também os seus percursos sutis, leves, secretos, e costumam, às vezes, querer nos levar a rever as fotografias velhas e amareladas do passado. Mas não mais nos assustamos com elas. Fotografias velhas são fotografias velhas e os nossos joelhos precisam estar sarados. Não sacrificar tanto os nossos joelhos. Cuidar da mente, do coração, dos traumas. Crescemos, e não podemos dar tanta margem aos traumas. Tudo tão complexo! Buscas. Enquanto digo isso, sou tomado pela cena em que Richard, em rugas e em grisalhos se recorda da sua infância... “Mamããããããe...” Que cena! E ainda mais acompanhada daquela música. P. Glass. Laura! A vida e tantas fotografias. Aquela foto em preto e branco... Aquele grito... E o impressionante O Grito, de Munch; e o grito de Bergman, Gritos e Sussurros... Amo esse filme. Consegui alguns filmes dele. Morangos Silvestres, Através de um espelho... “Traçamos um círculo imaginário ao nosso redor, para afastar aquilo que não faça parte do nosso jogo secreto.” Se a vida rompe esse círculo, os jogos ficam sem sentido... “e construímos um novo círculo e novas defesas.” Acho esse discurso muito interessante.<br />
<br />
Deixemos as fotos guardadas, e passemos a tesoura nelas... Crot crot crot... Somos muito mais fortes que as fotografias passadas. Não se justifica que fotografias sejam mais do que nós, afinal, fotos são apenas imitações da vida. Benjamim! Rsss... Crot crot crot. <br />
<br />
Estou ouvindo As Quatro Últimas Canções, de Strauss. Sou apaixonado... Apaixonado. Textos e músicas cortantes... As minhas saudades do agora, as minhas lembranças do presente instante, os meus desejos, o amor... A vida. Os sonhos que sempre se renovam, e renascem, e são regados mesmo quando sobram apenas as últimas gotas... Gotas se multiplicam e se multiplicam... e podem fazer oceanos, se lutamos e lutamos e novamente limpamos os joelhos. E, como diz Richard, “Mas ainda restam as horas, certo? Passa uma, depois outra, você atravessa uma, mas ai tem a outra.” <br />
<br />
Eu não queria viajar pra ai hoje. Queria ficar aqui dentro de casa, terminando de ler Mrs. Dalloway... e, assim que acabasse, ir à rua e comprar o novo livro de V. Woolf, lançado recentemente no Brasil, capa dura, vermelho meio vinho, erotizada...<br />
<br />
(o cheiro do quarto ou quinto café que preparo hoje...)<br />
<br />
Eu comendo letras, tragando-as pela minha emoção deste dia... rsss... Esta flor no “porta-retrato” está bem erotizada... O sexo se dilatando, se abrindo, deixando as mãos agora abertas, o desejo aberto... Hoje folheei Os Cem Melhores Poemas. Determinar os cem mais, os dez mais, pode parecer meio complexo, mas, partindo da visão de cada um dos conhecedores do assunto... Nos Cem tem Ana Cristina César, Adélia, Bandeira, Torquato, Vinícius, e A. dos Anjos, “toma um fósforo. Acende teu cigarro!”, e tem Bandeira, João Cabral, tanta coisa boa... Uma vez li um pra papai e ele caiu na gargalhada. Filosofia de Ascenso Ferreira: “Hora de comer – comer! Hora de dormir – dormir! Hora de vadiar – vadiar? Hora de trabalhar? – Pernas pro ar que ninguém é de ferro.” <br />
<br />
Vontade de doces. Rsss... “Sempre dando festa para esconder o silêncio!” As incessantes imagens de Mrs. Dalloway! O silêncio e tantos significados. Eu não quero que seja hoje!... Aquelas coisas ditas e repetidas: desejo antes o abraço que ainda não dei, e antes o beijo que ainda não senti, e antes o sexo que não gozei, e antes o olhar nos olhos e dizer novamente "eu te amo"... É preciso sempre reencontrar a vida, caso contrário, ela passa todas as horas, enquanto perdemos tanto tempo diante do nada, e diante das perguntas sem respostas, e diante do vazio repetitivo e que não produz solução alguma. Não perder o reencontro. Eu preciso muito deste encontro ontem, mas ontem passou, e preciso deste dia junto de mim, bem junto da minha alma e do meu corpo. <br />
<br />
Por um lado, eu queria estar agora pelas ruas da cidade que não é esta! Andaria todos os quilômetros rumo a este encontro de hoje. Vontade de andar pela avenida solitária e silenciosa, e andar pelos caminhos silenciosos da noite quase escura. <br />
<br />
Quero chorar. Um choro de tanta saudade, e não alimentar saudades utópicas. Fantasiar a vida, quando necessário. Fantasias diversas, e o brincar com elas quando a dor suplicar. E gritar com ela, se for preciso, mesmo que ela seja mais que eu. Beijos, e até amanhã. Eu preciso arrumar a bagagem. Sempre arrumo a bagagem no último instante.<br />
<br />
Publicado em "O Silêncio e a Bagagem"<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-26473884838887386432015-04-21T04:13:00.000+01:002015-04-21T04:23:32.621+01:00Noimarel e a varinha que não era de ouro<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhQeGLBWwrCEn0JCb1A0RjEbzHcBqi4Ijz-KJYOuLxAOxy_EaGUl69IG_5hbayDrhRuC6M9mzt3cRANr1B9gT0WaQ7HcmVH0FoxR8PBRWrErdWma9oNWXe2QlfwQY3ry9-JovDCNkMGHTo/s1600/IMG_0530.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhQeGLBWwrCEn0JCb1A0RjEbzHcBqi4Ijz-KJYOuLxAOxy_EaGUl69IG_5hbayDrhRuC6M9mzt3cRANr1B9gT0WaQ7HcmVH0FoxR8PBRWrErdWma9oNWXe2QlfwQY3ry9-JovDCNkMGHTo/s400/IMG_0530.JPG" /></a></div>e depois ainda teve coragem de cutucar com vara curta para ver se era verdade. Nem precisou cutucar pela segunda vez, pois S.P.T já foi logo levantando os ombros e levantando as mãos e estendendo as mãos, e os seus olhos foram se expressando de uma maneira estranha e insinuando que estava pronto a fazer qualquer coisa para realizar os seus desejos. Não os seus próprios desejos, mas os dele, que estava bem ali diante do seu olhar disfarçado de quem nem estava prestando atenção em seus passos. Ai pronto, foi só falar em realizar desejos que a cabeça de Noimarel deu logo aquela enlouquecida guinada e imaginou-se fazendo todas as coisas que a sua carne trêmula desejava. No princípio, até que ficou desconfiado da veracidade daquele sorriso, pois não podia acreditar que tantos prazeres estavam bem ali diante dos seus olhos: e ele poderia colocar o seu próximo passo no degrau que ele mais ansiava. Até que pensou que poderia haver alguma verdade que não as estampadas nas promessas cantaroladas, docemente, por S.P.T, pelas quais, ele, Noimarel, era capaz de dar a sua vida enfeitada com cores e com roupa "luxenta", “podre de chic”, como ele gostava. Aqueles ingressos plurais em suas mãos, o dinheiro da moda, um álbum cheinho de fotografias com tantos rostos à mercê de uma liberdade de escolha a três por quatro, no quarto ou na rua. Mas, se ao menos as coisas parassem por ai!... <br />
<br />
No entanto, exatamente depois de ter acontecido tantas coisas que lhe doeram em tantas partes, achou de cutucar S.P.T com a vara curta, de tão quebrada que as suas pontas já haviam sido. No começo, até que ficou com aquele meio receio: quando alguns filmes antigos, e de ontem, e de sábado, e do mês anterior passaram iguais a relâmpagos e trovões pela sua cabeça. Mas, depois da primeira manifestação de ter sido espicaçado e atiçado por S.P.T, havia travado uma guerra: aparentemente sutil. Dessa história contaram que, no primeiro vacilo dado por Noimarel, S.P.T fez de conta que estava se espreguiçando e, naquela de estirar os braços, foi lá e “crau”: puxou aquele pedaço de vara que já estava tão curta e a tornou em mil pedacinhos: a ponto de suas unhas ficarem bem encardidas por aquela estranha tinta furta-cor. Neste momento, ele teve um sintoma de pânico e até sentiu uns calafrios estremecendo a sua garganta. Porém, não se sabe se foi mágica, mas sabe-se que, diante do seu olhar espantado, S.P.T juntou aqueles pedacinhos de madeira até que, de repente, a vara estava inteirinha novamente. Tudo isto diante do olhar perplexo de Noimarel, que foi tomado por um desejo compulsivo de observar cada foto daquele álbum de fotografias. S.P.T virou as costas por uns poucos segundos e, quando virou de frente, foi com aquele sorriso largo, misterioso, e estendeu diante dos olhos de Noimarel uma varinha completamente dourada de um puro ouro, que de tão dourada não suportou a própria sedução e virou fogo: aquele ouro se esparramando pelo chão. Noimarel, que se achava tão esperto e dotado de todas as peripécias de ocultar as suas ações irreveláveis, quase deu um grito de pavor, mas, sorriu ao concordar que aquela varinha poderia encantar todos os seus desejos de sedução e planos outros. Pronto: em meio a calafrios, nem percebeu que uma porção de cera vermelha havia caído diante dos seus pés: vinda daquela varinha que era mais do que de condão. S.P.T tinha a mórbida mania de usar este gesto como um selo de acordo, sorrateiramente! <br />
<br />
Noimarel ficou ali meio querendo sair e meio querendo ficar, quando percebeu que um terceiro calafrio fez estremecer todo o seu corpo. Disfarçou que tudo era uma brincadeira: da vara, um livro de páginas velhíssimas foi lançado aos seus pés. A capa era novíssima, como impressa naquele exato momento. Olhou bem para o título do livro, e tomado por um pavor, correu para o seu quarto, que já não era o seu quarto. Percebeu que estava tão escuro, que ele seria capaz de fazer qualquer coisa para voltar ao brilho daquela varinha que só podia mesmo era ser mágica. Ficou ali titubeando. De repente, foi tomado por uma angústia que se misturava com as tantas coisas maravilhosas que dizia estar vivendo. Estranhou aquela escuridão e lamentou baixinho o estar num abominável e bolorento quarto gelado, onde, de forma obscura, a desejada luz havia atravessado os vidros da janela que ele mesmo havia pintado num dia de muita euforia. Ficou ali pensando estas coisas, e estas palavras pareciam ecos de palavras que lhes eram intimamente presentes.<br />
<br />
Não suportando aquele negrume, recorreu ao brilho misterioso da varinha de condão. Daí pra frente, como se tomado por algum efeito de poção mágica, foi se entregando a todos os caminhos que ela lhe conduzia. Abriu aquele álbum de fotografias e fez viagens dionisíacas. Suores pelo seu corpo, umidades de prazeres em suas entranhas, embalado pelo erotismo de um gosto musical peculiar. Sentia o impregnar de tantos corpos ao seu, num verdadeiro fluxo de consciência. Luzes diversas estavam brilhando em sua vida, uma verdadeira festa como sempre ambicionava. O seu sorriso se alargava e já nem mais sentia saudades de algum tempo: se o seu futuro lhe era promessas de tantos álbuns de fotografias fascinantes.<br />
<br />
Um dia, porém, o pêndulo voltou a oscilar para trás. Pode parecer estranho, mas o primeiro indício perceptível foi uma crosta grossa que começou a nascer em sua cabeça, entrelaçando em cada fio dos seus cabelos, enraizando pela sua testa, em volta das suas orelhas, até se manifestar no meio das suas costas. Pode parecer estranho: o seu perfume foi invadido por um mal cheiro que afetava todos os seus hálitos. Então, numa madrugada em que o seu peito se corroía de tremor, levantou-se da cama e, subitamente, se lembrou daquela varinha que havia se tornado em ouro até se tornar em fogo e, derretida, se espalhou pelo chão. <br />
<br />
Num gesto de súplica, mesmo contra a sua vontade, evocou por S.P.T, mas não mais o encontrou. Visualizou o reluzir dourado da varinha, na tentativa de fitar a profundeza do seu brilho, entretanto, não encontrava forças ao sentir que aquela luz poderia destruir a sua retina. Queria penetrar o infinito em busca de respostas, mas, diante do que lhe era impossível, se sentiu lançado do êxtase do contentamento para uma dor que lhe ardia a alma. Deixou-se cair pelo chão e, sussurrando ao seu coração, queixou a si mesmo de um espetáculo tão maravilhoso e que começava a desaparecer diante dos seus anseios! “Tão somente um espetáculo, um espetáculo encantador!...” Lamentava. E falava de uma vontade de agarrar entre as suas mãos e o seu peito a infinita natureza que estava diante dele! “Nesta dor que em mim arde pareço me consumir!”, balbuciou; e chorou um pouco, com a escassez do seu choro. Lembrou-se da estranha permuta feita em busca de suas expectativas e da sua velada coragem em ceder o que de mais intimo possuía. Ficou ali prostrado com o rosto colado em seus desejos, até que uma meia-luz apareceu sobre os seus ombros e, garante ele, uma espécie de voz penetrou em seus ouvidos, dizendo que podemos ser livres para fazer a primeira escolha, mas que da segunda em diante pode ser que nunca nos seja cedida o comando. Enquanto ele refletia sobre estas palavras, um estridente e ensurdecedor assobio ecoou, pungentemente, em seu ouvido.<br />
<br />
Em meio a uma melodia densa e inesquecível, ele ouvia palavras e assobios que dilatavam em seu peito a sensação de que eram semelhantes a ecos de uma história que muito já havia escutado. <br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-9719727005925401332015-03-28T20:06:00.000+00:002015-03-28T20:06:10.019+00:00A vida dentro da mala <div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgd8ZBOq_MLoPHkWIAguyb0nJrPiFzov91TknJIJzJ0J5rpwpwWNSKjJcjbtLn5IwTq0Hjzm0Ko8XLSGhwiAh7m-DddbSapdBhK4msHVTltoSh2g_ii-X5G6bacvNlz2nNiQP42W-cjIWM/s1600/CIMG2136.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgd8ZBOq_MLoPHkWIAguyb0nJrPiFzov91TknJIJzJ0J5rpwpwWNSKjJcjbtLn5IwTq0Hjzm0Ko8XLSGhwiAh7m-DddbSapdBhK4msHVTltoSh2g_ii-X5G6bacvNlz2nNiQP42W-cjIWM/s400/CIMG2136.JPG" /></a></div> A vida dentro de uma mala velha, fechadura enferrujada pela dor angustiante de um tempo passado. A coleção de relógios espalhada pelo chão, abandonada depois dos dias que mais nada parecia lhe interessar. A vida que se tornara mofa dentro da mala, forro em cetim que desde tempos atrás não mais resistiu às expectativas se esvaziando até tornar-se pó. Pó como a vida se torna, ferrugem como a vida se torna, quando se passa pela vida agarrados a passados que se foram, e amarrados aos dias que já excederam todos os seus limites. Abandonados. Abandonados os momentos que chegariam em êxtases. Abandonados, abandonados os instantes, os melhores instantes atravessando imperceptíveis pelas janelas, enquanto o horizonte grita quase se explodindo sobre os seus pés. Alheio aos seus olhos, o instante presente emudece; o olhar mofo, enrugado, necrose contornando as olheiras negras; e os olhos quase fechados, aconchegando-se doloridamente ao passado que nem existe mais. <br />
A janela fechada e as portas quase lacradas para a claridade dos dias. A quase escuridão da casa em pleno sol latejando o mundo lá fora, alheio àquele universo reprimido por um ar morno, cheiro de tantas coisas guardadas, papéis e objetos plurais de sentidos, móveis que há tanto tempo fincaram as suas verdades em espaços imóveis. E ela. Ela incapaz de rever as horas, um peso em seu corpo, impedindo o movimento das paisagens encarnadas nas páginas dos livros que lhe foram os preferidos nos dias que se tornaram apenas recordações. O seu olhar turvo, cálido, nocauteando as imagens dos quadros na parede, prazerosamente adquiridos nos dias em que a vida era.<br />
Tantos dias e tantos anos dentro de um só. Tantos dias e tantas horas em apenas um dia. Cenários mudos, o coração exausto, suportando a densidade das horas que, sem piedade, sobre ela caiam. Ela, agarrada ao silêncio e ao incessante fluxo dos seus pensamentos, nem percebeu que a casa havia escurecido de vez. Uma penumbra negra, melancólica, exasperada. Aquelas palavras lacradas e acolhidas pela sua memória, eternizada.<br />
<br />
Em "O Silêncio e a Bagagem" (2008)I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-50612084737116738532015-02-28T20:29:00.002+00:002015-02-28T20:29:36.190+00:00Prefácio do livro "Enquanto as folhas são espalhadas pelo vento" (2002) (Parte)<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjXt4CDSFgV7dpsVT618v4aQZbLs8qw25-yYhGtJEn4fHKrEeiO1L1PsHB8bJHAsAM56hX2UA2Hm7JGJFcL_9QhOUV9o4pAmS8LEaEe0g5fQS_ciV_8ePUuYBmudqcUjk9SiNjual9_So4/s1600/foto.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjXt4CDSFgV7dpsVT618v4aQZbLs8qw25-yYhGtJEn4fHKrEeiO1L1PsHB8bJHAsAM56hX2UA2Hm7JGJFcL_9QhOUV9o4pAmS8LEaEe0g5fQS_ciV_8ePUuYBmudqcUjk9SiNjual9_So4/s320/foto.JPG" /></a></div><br />
Enquanto ouço algumas das diversas histórias que surgem no dia a dia, inevitavelmente vou criando imagens, frases, parágrafos e, descompromissadamente, os visualizo como possibilidades de contos. Algumas vezes, tento transcrevê-los e percebo que não passam de empolgações de um instantes ou que nem tudo é contagiante quando vai para o papel. Parece haver o vazio da descoberta, ao menos para o ato de escrever, quando os significantes terminam não satisfazendo a angústia e o prazer da procura. No entanto, além de uma possível elaboração dessas histórias, mesmo correndo o risco de, algumas vezes, se tornar um texto insosso, é possível criar e recriar a partir dessas diversas situações. A história pode se tornar uma outra, independente, adquirindo a sua própria voz em meio a possíveis semelhanças entre o que foi e o que é.<br />
<br />
Foi assim que comecei a elaborar e também a desistir de alguns contos. Alguns deles se perderam pelos primeiros parágrafos; outros insistiram em suas existências mesmo que para permanecerem engavetadas. Porém, mesmo desconfiado, fui acreditando que alguns deles, em meio a esforços e exercícios, conseguiram agradar a alguns leitores abertos a leituras, digamos, experimentais. Revisões diversas e a angústia de nunca vê-los impassíveis de mudanças. Até que um dia, como um frito de curiosidade e de desejo forte de arriscar, tomado por uma coragem de realizá-los como literatura, eles chegaram até aqui, se expondo, talvez pretensiosamente, como resultado de textos concluídos - até o instante de cada leitor prossegui-los com os seus próprios questionamentos e conclusões.<br />
<br />
O primeiro desta série de contos é exatamente o que dá título ao livro. Era inverno de 2000 e, depois de um longo tempo olhando a imagem exposta lá fora, as árvores secas, as folhas amareladas e avermelhadas a rolar pelas ruas ainda com resto de neve, paisagem sombria e a me remeter a uma outra imagem longe, distante, porém muito mais próxima do que tudo naquele instante, frases foram sendo formadas na tentativa de transcrever aquela conexão de instantes. Surgiu, então, "Enquanto as folhas são espalhadas pelo vento", texto originalmente mais extenso do que o definitivo. Muitas vezes, as palavras vêm como correntezas fortes, emoções sem limites, informações sem medida, levando o texto a se exceder no seu objetivo inicial, havendo assim uma certa necessidade de ajustes em favor de uma sintonia maior com a literatura e, claro, com o leitor. Escrever nem sempre é se deixar levar por todas as emoções que nos invadem, mas tentar excluir o que nos parece excesso sem, no entanto, ferir o excesso que nos impulsiona a escrever. E, nesta ansiedade natural em busca de um certo equilíbrio, muitas folhas vão sendo espalhadas pelo vento, ora encontrando um aconchego, ora vivendo em seus desassossegos. I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-43108319699198564302015-02-03T00:17:00.002+00:002015-02-03T00:17:56.086+00:00Foi o silêncio<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkm-Pu18Y0TTP3Ib1iSuXyykHCpqNUVIB_ldwJ3PZ8lWZrw41IQ18nk7W6sBy_ABlG-F0dmgw-SAntzFgeAL09TAOghGGu1ITSqPfms2JwoasmKQdHGIWXEb3691hgbQbfLv5uQbFV7Ss/s1600/6128.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhkm-Pu18Y0TTP3Ib1iSuXyykHCpqNUVIB_ldwJ3PZ8lWZrw41IQ18nk7W6sBy_ABlG-F0dmgw-SAntzFgeAL09TAOghGGu1ITSqPfms2JwoasmKQdHGIWXEb3691hgbQbfLv5uQbFV7Ss/s400/6128.jpg" /></a></div><br />
Foi o silêncio, my dear! Foi o silêncio que me fez calar assim <br />
O silêncio que repousa depois de atravessar uma multidão inteira ao redor. <br />
Percebe o que digo? <br />
A multidão pode ser inteira, cheia de vozes, cheia de palavras, bem tal como o foi horas atrás, mas, ainda assim, suas vozes podem ser inaudíveis, <br />
e não apenas. <br />
Percebe agora? <br />
Perceba que as palavras podem ser exuberantes, mas serem opacas e até invisíveis, <br />
sem som algum a sair das bocas em movimentos e nada mais,<br />
os lábios a gesticularem palavras num silêncio preciso.<br />
É o silêncio, my darling! É o silêncio que repousa entre as flores do jardim, em movimentos determinados pelo vento... <br />
O vento, my dear! O vento uiva como leão e murmura em silencio com a mais doce delicadeza, <br />
mas não apenas.<br />
E nem apenas o vento.<br />
I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-7406280862961744360.post-7817932777099654542015-01-02T22:27:00.000+00:002015-01-03T10:21:28.364+00:00a folha, a pedra e o rio<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiQ23aZI0hfkka5lzo1V_jgGIlc83mkfiRiTdDegNXec7cpBTjhHTLGVeTokrB57yXLnvmXt5lV8MBDCswvtjanc6heRLKtn-PFeTrby1R5mcn9JkuiqKbmLPWHzJa5yFNJm32Y7efEe8Y/s1600/IMG_1036.JPG" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiQ23aZI0hfkka5lzo1V_jgGIlc83mkfiRiTdDegNXec7cpBTjhHTLGVeTokrB57yXLnvmXt5lV8MBDCswvtjanc6heRLKtn-PFeTrby1R5mcn9JkuiqKbmLPWHzJa5yFNJm32Y7efEe8Y/s400/IMG_1036.JPG" /></a></div><br />
Preciso escrever qualquer coisa hoje e não encontro nada,<br />
talvez a pedra que hoje vi no meio da rua<br />
talvez a folhagem seca, seca mas bela, tão bela flutuando ao movimento do vento frio, bem frio,<br />
aconchegante o frio e o bailar da folha, folhagens, as folhas cobrindo a pedra no meio do caminho.<br />
<br />
Preciso escrever qualquer coisa hoje,<br />
e lá fora encontro as palavras envolvendo as sensações, <br />
algumas leves, tão leves e suaves e outras assim,<br />
meio assim as sensações e eu sem saber ao certo se é a leveza ou se a correnteza é outra,<br />
a correnteza no rio,<br />
o rio dentro de mim e eu dentro do rio, lá dentro, lá dentro, eu navegando no rio,<br />
a pedra e a folhagem dentro do rio, a folha flutuando, flutuando,<br />
a folha tão bela flutuando no rio e a pedra lá no fundo<br />
do rio.<br />
<br />
Preciso escrever qualquer coisa hoje,<br />
talvez eu fale de uma pedra no meio da estrada e tão logo eu fale de um rio,<br />
mas antes e depois falarei da folha, a folha flutuando ao movimento do vento frio,<br />
tão frio e suave, apenas o vento é o frio.I. Luiz Andradehttp://www.blogger.com/profile/09673022442163139662noreply@blogger.com0