quinta-feira, 8 de outubro de 2009

"Enquanto as folhas são espalhadas pelo vento" - Uma parte do Prefácio

Enquanto ouço algumas das diversas histórias que surgem no dia-a-dia, inevitavelmente crio imagens, frases, parágrafos e, descompromissadamente, os visualizo como possibilidades de contos. Algumas vezes, tento transcrevê-los e percebo que não passam de empolgações de um instante ou que nem tudo é contagiante quando vai para o papel. Parece haver o vazio da descoberta, ao menos para o ato de escrever, quando os signficantes terminam não satisfazendo a angústia e o prazer da procura. No entanto, além de uma possível elaboração dessas histórias, mesmo correndo o risco de, algumas vezes, se tornar um texto inerte ou insosso, é possível criar e recriar a partir dessas diversas situações. A Historia pode se tornar uma outra, independente, adquirindo a sua própria voz em meio a possíveis semelhanças entre o que foi e o que é.

Foi assim que comecei a elaborar e também a desistir de alguns contos. Alguns deles se perderam pelos primeiros parágrafos; outros insistiram em suas existências mesmo que para permanecerem engavetados. Porem, mesmo desconfiado, fui acreditando que alguns deles, em meio a esforços e exercícios, conseguiram agradar a alguns leitores abertos a leituras, digamos, experimentais. Revisões diversas e a angústia de nunca vê-los impassíveis de mudanças. Até que um dia, como um grito de curiosidade e de desejo forte de arriscar, tomado por uma coragem de realizá-los como literatura, eles chegaram até aqui, se expondo, talvez pretensiosamente, como resultado de textos concluídos – até o instante de cada leitor prossegui-los com os seus próprios questionamentos e conclusões.

O primeiro desta série de contos é exatamente o que da título ao livro. Era inverno de 2000 e, depois de um longo tempo olhando a imagem exposta lá fora, as árvores secas, as folhas amareladas e avermelhadas a rolar pelas ruas ainda com restos de neve, paisagem sombria e a me remeter a uma outra imagem longe, distante, porém muito mais próxima do que tudo naquele instante, frases foram formadas na tentativa de transcrever aquela conexão de instantes. Surgiu, então, Enquanto as folhas são espalhadas pelo vento, texto originalmente mais extenso do que o definitivo. Muitas vezes, as palavras vêm como correntezas fortes, emoções sem limites, informações sem medida, levando o texto a se exceder nos seu objetivo inicial, havendo assim uma certa necessidade de ajustes em favor de uma sintonia maior com a literatura e claro, com o leitor. Escrever nem sempre é se deixar levar por todas as emoções que nos invadem, mas tentar excluir o que nos parece excesso sem, no entanto, ferir o excesso que nos impulsiona a escrever. E, nesta ansiedade natural em busca de um certo equilíbrio, muitas folhas são espalhadas pelo vendo, ora encontrando um aconchego, ora vivendo em seus desassossegos.

[…].

In: Enquanto as folhas são espalhadas pelo vento. Prêmio Zélia Saldanha – Contos. Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB. (Edital 039/2002).

Um comentário:

  1. "Escrever nem sempre é se deixar levar por todas as emoções que nos invadem, mas tentar excluir o que nos parece excesso sem, no entanto, ferir o excesso que nos impulsiona a escrever"...que equação laboriosa!Confesso que sem o excesso eu nunca conseguiria, mas que com ele eu nunca me dou por satisfeito...rsss

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