segunda-feira, 10 de agosto de 2015

Mas que jogo?


“Eu não estou entendendo nada do que você está falando.” Respondeu à insinuação sem saber exatamente em que direção manter o olhar. Mas estava entendendo sim. Surpreso. Muito surpreso. Mas estava entendendo sim. Dizia isto apenas para tentar disfarçar o seu impacto ao ouvir o que estava ouvindo. Não era possível não ter sido tão secreto o seu esconderijo! Assim pensava, quase sem tempo para descobrir onde havia falhado. “Não está entendendo?” E ela repetiu tudo novamente, em entrelinhas, da maneira mais clara e dolorida repetiu, sem qualquer intenção de perversidade, mas com o propósito de esclarecer que o jogo havia acabado. “Mas que jogo?” Ele perguntou, ainda sem acreditar. A sensação de uma forte, muito forte pancada em sua cabeça, e de tudo, absolutamente tudo ser levado em meio a uma correnteza forte, em um rio sem rumo. “Mas de que jogo você está falando?” Tentou um desafio. “Quer que eu diga palavra por palavra de que jogo eu estou falando?” Ela retrucou, cautelosamente, no mesmo compasso em que, sentada sobre aquela excêntrica poltrona alaranjada, ela passava a folha seguinte, daquela outra saga, a qual ela estava lendo. A cabeça se movia quase imperceptível, enquanto os olhos se alternavam entre o livro e os intensos olhares sobre ele, que permanecia quase imóvel diante dela.
Ele não respondeu se seria necessário que tudo fosse dito ou repetido palavra por palavra. Então, ouviu a mesma pergunta, de forma ainda mais compassada, dilacerante. “Vou a cozinha pegar água.” Foi a sua resposta. Atrapalhando-se sobre o tapete, saiu em direção à cozinha. As pernas trêmulas, visivelmente. Ela o acompanhou com o olhar e percebeu o seu nervosismo que, de certa maneira, lhe dava prazer. Intimidá-lo amenizava a sua dor. Parou o olhar sobre o nada e respirou uma dor em alguns cinco segundos.
Na cozinha, algo se espatifou no chão. Ela levantou o olhar, mas, não ouvindo qualquer outro ruído naquela direção, insinuou retomar a leitura.
Ele parado na cozinha, tenso. O copo aos pedaços espalhados pelo chão molhado. Olhou aqueles cacos com um olhar apavorado, e não enxergou nada, além dos seus próprios pensamentos atormentados: “E agora?”
Ela na sala. O olhar congelado sobre as letras embranquecidas. Decidida. Fim

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